O prémio “Orelhas de Burro” - jorge cordeiro simões
Quando, a altas horas da noite, paro junto à estátua de El’ Rei D. Afonso ali à ponte da Levada, o que ali vejo não é só um trabalho de arte, com um busto de bronze em cima duma grande pedra esculpida, mas sim a presença do rei fundador coberto de invisível manto feitos de farrapos de saber, acumulado ao longo de quase nove séculos de História que ele lá de longe viu passar e que ali se diverte com o que ouve e vê. Daí alguma irreverência no muito que já lhe ouvi e que em tempos passados por aqui fui relatando. Na sua frente junto da ponte da Levada embelezando e dando vida ao local,
Durante mais de 30 anos esteve uma tarambola que muito trabalhou e que de velhice e maus tratos morreu. E essa nas horas tardias em que eu ali ia, teve muitas conversas comigo e com o busto de D. Afonso.
Mas tudo cansa e por isso desde há mais duma dúzia de anos que lá não ia, ou arriscava sequer passar a altas horas da noite.
Mas agora está lá uma nova tarambola à qual desde já espero que sejam dedicados os devidos cuidados, para que possa ter uma vida mais longa que a anterior, que durou cerca de 33 anos, por forma que ela ali se mantenha a dar vida ao local e a alegrar a vista de quem por lá passa, para que possam desfrutar em pleno da beleza de tão belo recanto da cidade.
Por isso e depois de muito hesitar, acabou por vencer uma mistura de curiosidade e saudade, tendo-me sujeitado a sacrificar parte duma noite de sono para cerca das 3 da manhã quando a cidade dormia, sair de casa e ir em passeio nocturno até ao idílico local onde eles estão. E assim no silêncio da noite só quebrado pelo ruído da corrente do rio Almonda, fui chegando de fininho e como noutros tempos fazia, parei junto do muro de protecção da rua, ali me detive a cerca de metade da distância que separa aqueles dois, observando o lento mas incessante trabalho da tarambola.
Escasso minuto passado, ouvi vindo de trás de mim a voz rouca e arrastada de D. Afonso dizendo “O nosso amigo está de volta. Seja bem-vindo”. Voltei-me para D. Afonso e dando-lhe as boas noites perguntei se a sua nova companheira também falava. Respondeu-me que ela era nova mas doidivanas e não tinha conversa séria, limitando-se a cantarolar muito baixinho uma cantilena sem pés nem cabeça, que era sempre a mesma e já estava farto de a ouvir.
Voltei-me outra vez para a tarambola prestando toda a atenção aos sons vindos do seu lado e, apesar dos meus ouvidos já terem tido melhores dias, comecei a identificar a cantilena repetitiva referida por El’ Rei, na qual e em resumo ela exprimia a vaidade e alegria por ser nova e bonita, por estar num lugar tão lindo, ser motivo de muita admiração de quem ali passava, e que aquela estátua descarada lá em cima não tirava os olhos dela e até lhe mandara “piropos”. Ou seja, D. Afonso tinha razão para estar farto de a ouvir.
Tentei ir à fala com ela e na esperança de ser bem sucedido disse: “Olá bela tarambola, eu vim aqui para saber se tal como a antiga também queres falar comigo, mas desde já te digo que és muito bonita”.
Acertei em cheio! A cantilena parou ficando apenas o som da água do rio. Mas passado talvez pouco mais dum minuto, ouvi a sua voz fina e alegre responder-me mais ou menos nestes termos: “Olha lá uma coisa: não seria melhor estares na cama a estas horas? Ganha juízo e cala-te com esses galanteios, pois para isso me basta o busto palerma que de mim não tira os olhos e me enche de piropos que agora até são proibidos por lei”.
Ouvi e calei. Ela voltou à sua cantilena e eu voltei-me para D. Afonso perguntando se estava tudo bem com ele e se havia novidades, ao que ele me respondeu pedindo que dissesse lá na Câmara para darem o prémio “orelhas de burro” (foi mesmo isto), a quem decidira plantar aquelas árvores à sua frente, ao que parece para o castigar, pois logo que aparecerem as folhas na sua plenitude, as mesmas irão impedir que tanto ele como quem ali passa, possa apreciar o excelente trabalho de recuperação feito na antiga Central e até mesmo a tarambola, acrescentando que com tanto sítio bom para plantar árvores, é de lamentar que não tenham sido capazes de encontrar melhor local, pedindo agora ele para que corrijam tamanho erro.
Disse-lhe que me parecia que tinha razão e que iria tentar fazer chegar a sua queixa a quem de direito. Agradeceu-me e pediu para que eu aparecesse mais vezes. Eu despedi-me pois eram bem horas de ir descansar.
O prémio “Orelhas de Burro” - jorge cordeiro simões
Quando, a altas horas da noite, paro junto à estátua de El’ Rei D. Afonso ali à ponte da Levada, o que ali vejo não é só um trabalho de arte, com um busto de bronze em cima duma grande pedra esculpida, mas sim a presença do rei fundador coberto de invisível manto feitos de farrapos de saber, acumulado ao longo de quase nove séculos de História que ele lá de longe viu passar e que ali se diverte com o que ouve e vê. Daí alguma irreverência no muito que já lhe ouvi e que em tempos passados por aqui fui relatando. Na sua frente junto da ponte da Levada embelezando e dando vida ao local,
Durante mais de 30 anos esteve uma tarambola que muito trabalhou e que de velhice e maus tratos morreu. E essa nas horas tardias em que eu ali ia, teve muitas conversas comigo e com o busto de D. Afonso.
Mas tudo cansa e por isso desde há mais duma dúzia de anos que lá não ia, ou arriscava sequer passar a altas horas da noite.
Mas agora está lá uma nova tarambola à qual desde já espero que sejam dedicados os devidos cuidados, para que possa ter uma vida mais longa que a anterior, que durou cerca de 33 anos, por forma que ela ali se mantenha a dar vida ao local e a alegrar a vista de quem por lá passa, para que possam desfrutar em pleno da beleza de tão belo recanto da cidade.
Por isso e depois de muito hesitar, acabou por vencer uma mistura de curiosidade e saudade, tendo-me sujeitado a sacrificar parte duma noite de sono para cerca das 3 da manhã quando a cidade dormia, sair de casa e ir em passeio nocturno até ao idílico local onde eles estão. E assim no silêncio da noite só quebrado pelo ruído da corrente do rio Almonda, fui chegando de fininho e como noutros tempos fazia, parei junto do muro de protecção da rua, ali me detive a cerca de metade da distância que separa aqueles dois, observando o lento mas incessante trabalho da tarambola.
Escasso minuto passado, ouvi vindo de trás de mim a voz rouca e arrastada de D. Afonso dizendo “O nosso amigo está de volta. Seja bem-vindo”. Voltei-me para D. Afonso e dando-lhe as boas noites perguntei se a sua nova companheira também falava. Respondeu-me que ela era nova mas doidivanas e não tinha conversa séria, limitando-se a cantarolar muito baixinho uma cantilena sem pés nem cabeça, que era sempre a mesma e já estava farto de a ouvir.
Voltei-me outra vez para a tarambola prestando toda a atenção aos sons vindos do seu lado e, apesar dos meus ouvidos já terem tido melhores dias, comecei a identificar a cantilena repetitiva referida por El’ Rei, na qual e em resumo ela exprimia a vaidade e alegria por ser nova e bonita, por estar num lugar tão lindo, ser motivo de muita admiração de quem ali passava, e que aquela estátua descarada lá em cima não tirava os olhos dela e até lhe mandara “piropos”. Ou seja, D. Afonso tinha razão para estar farto de a ouvir.
Tentei ir à fala com ela e na esperança de ser bem sucedido disse: “Olá bela tarambola, eu vim aqui para saber se tal como a antiga também queres falar comigo, mas desde já te digo que és muito bonita”.
Acertei em cheio! A cantilena parou ficando apenas o som da água do rio. Mas passado talvez pouco mais dum minuto, ouvi a sua voz fina e alegre responder-me mais ou menos nestes termos: “Olha lá uma coisa: não seria melhor estares na cama a estas horas? Ganha juízo e cala-te com esses galanteios, pois para isso me basta o busto palerma que de mim não tira os olhos e me enche de piropos que agora até são proibidos por lei”.
Ouvi e calei. Ela voltou à sua cantilena e eu voltei-me para D. Afonso perguntando se estava tudo bem com ele e se havia novidades, ao que ele me respondeu pedindo que dissesse lá na Câmara para darem o prémio “orelhas de burro” (foi mesmo isto), a quem decidira plantar aquelas árvores à sua frente, ao que parece para o castigar, pois logo que aparecerem as folhas na sua plenitude, as mesmas irão impedir que tanto ele como quem ali passa, possa apreciar o excelente trabalho de recuperação feito na antiga Central e até mesmo a tarambola, acrescentando que com tanto sítio bom para plantar árvores, é de lamentar que não tenham sido capazes de encontrar melhor local, pedindo agora ele para que corrijam tamanho erro.
Disse-lhe que me parecia que tinha razão e que iria tentar fazer chegar a sua queixa a quem de direito. Agradeceu-me e pediu para que eu aparecesse mais vezes. Eu despedi-me pois eram bem horas de ir descansar.
![]() Imagino que as últimas eleições terão sido oportunidade para belos e significativos encontros. Não é difícil pensar, sem ficar fora da verdade, que, em muitas empresas, patrões e empregados terão ambos votado no Chega. |
![]() "Hire a clown, get a circus" * Ele é antissistema. Prometeu limpar o aparelho político de toda a corrupção. Não tem filtros e, como o povo gosta, “chama os bois pelo nome”, não poupando pessoas ou entidades. |
![]() A eleição de um novo Papa é um acontecimento sempre marcante, apesar de se viver, na Europa, em sociedades cada vez mais estranhas ao cristianismo. Uma das grandes preocupações, antes, durante e após a eleição de Leão XIV, era se o sucessor de Francisco seria conservador ou progressista. |
![]() |
![]() |
![]() |
![]() |
![]() |
![]() |
![]() Agora que nos estamos a aproximar, no calendário católico, da Páscoa, talvez valha a pena meditar nos versículos 36, 37 e 38, do Capítulo 18, do Evangelho de João. Depois de entregue a Pôncio Pilatos, Jesus respondeu à pergunta deste: Que fizeste? Dito de outro modo: de que és culpado? Ora, a resposta de Jesus é surpreendente: «O meu reino não é deste mundo. |