• SOCIEDADE-  • CULTURA  • DESPORTO  • OPINIÃO
  Terça, 10 Dezembro 2024    •      Directora: Inês Vidal; Director-adjunto: João Carlos Lopes    •      Estatuto Editorial    •      História do JT
   Pesquisar...
Sex.
 14° / 3°
Céu nublado com chuva fraca
Qui.
 13° / 2°
Céu limpo
Qua.
 13° / 3°
Céu limpo
Torres Novas
Hoje  14° / 3°
Céu limpo
       #Alcanena    #Entroncamento    #Golega    #Barquinha    #Constancia 

Plantação intensiva: do corte à escovinha e tudo em fila aos horizontes metalificados - maria augusta torcato

Opinião  »  2024-03-08  »  Maria Augusta Torcato

Não sei se por causa das minhas origens ou simplesmente da minha natureza, há em mim algo, muito forte, que me liga a árvores, a plantas, a flores, a animais, a espaços verdes ou amarelos e amplos ou exíguos, a serras mais ou menos elevadas, de onde as neblinas se descolam e evolam pelos céus, a pedras, pequenas ou pedregulhos, espalhadas ou juntinhas e a regatos e fontes que jorram espontaneamente. E, ainda, a todos os bicharocos (expressão de afeição e não de desafeto) que povoam estes espaços e todos os outros, se os deixarem.

Amo a natureza e tudinho o que ela nos oferece. Pelo menos eu sinto como uma oferta, uma dádiva, tudo o que ela nos dá e temos, ali, à mão de semear. Amo a liberdade e as teias de complexidade entre todos os elementos e seres que a fazem, a natureza. É isso que ela é: simplicidade e complexidade, dádiva e entrega, convivialidade, respeito e empatia. Um exemplo para os homens e mulheres e para a sua convivência e sociabilidade. Além de referência para a aprendizagem do ser, a natureza é, também, acolhimento e aconchego, por múltiplas razões.

Daí que me sinta triste, às vezes até um pouco enraivecida (não consigo ficar indiferente como me exorta Ricardo Reis), por verificar que muitos dos “nossos” olivais, hoje, mais não são do que exércitos, um pouco hirtos, como os soldados de cabelo à máquina zero ou à escovinha, todos em fila, muito direitinhos, numa disciplina mecânica.

Quando percorro algumas estradas não posso deixar de gostar do verde, intensivo extensivo que se estende, pela esquerda e pela direita, até ao horizonte que toca o céu. Porém, invade-me uma espécie de angústia, sinto um aperto no coração, porque me parece que todas aquelas árvores, que ali estão dispostas, são prisioneiras, não da terra que lhes alimenta as raízes, mas de uma regra qualquer que determina a sua existência, não simples e natural, mas produtiva. Se produzir, viverá. Se não produzir, não viverá. Viverá apenas enquanto produzir. Coitadas das oliveiras. Já devem ter pensado que, afinal, só existem enquanto não tiverem existência. Que bom seria poderem ver os seus ramos a crescerem, a tocarem-se, a serem admiradas pelos seus troncos grossos e rugosos, efeito da sua vida natural, persistente e resistente e do tempo que neles se grava.

E agora, para seu, e meu, grande desgosto, ainda resolveram cortar todas as árvores vizinhas e os arbustos que a elas se encostavam, para substituírem essas seivas naturais, esses purificadores do ar, esses catalisadores ambientais, por plantações metaliformes, de pernas finas, rijas e frias, e igualmente hirtas, furando a terra, cobertas de placas de metal e vidro, ou lá o que é, que projetam um brilho metálico longo, até onde a vista alcança, mas que nada tem de colorido do arco-íris, nem das transparências brilhantes das gotas de orvalho que antes humedeciam e suavizavam as folhas.

Sim, estou a falar das extensas plantações intensivas de painéis solares que se atravessam nos campos e no nosso campo de visão, que nos ferem vista e alma. Como é possível matarem-se árvores que libertam oxigénio, que consomem dióxido de carbono, que podem aliviar o sofrimento a este nosso planeta moribundo, em nome, precisamente, da produção de uma energia limpa, pouco ou nada poluidora? Como é possível dar-se lugar a esta flora artificial, monocromática, cinzenta, destruindo-se a matizada e vivificada flora e sem a qual, definitivamente, não sobreviveremos? Talvez já estejamos todos mortos e ainda não o percebemos. Talvez nós já tenhamos sido transformados também em seres metalinos, arregimentados, mas cultivam-nos a ilusão de que somos gente, gente de carne e osso, pessoas, com opções e livres. É uma boa ilusão, já que cultiva a aceitação e a não questionação, antefaces da insatisfação humana.

Será que os propósitos que dizem servir estes mundos do metal não poderiam, pelo menos, respeitar a nossa mãe flora e ficar subordinados ao seu direito de usucapião?

Antevejo, daqui a meia dúzia de anos, amontoados de ferrugem, estilhaços estéreis de vidros e metal semeados pelas terras, ao lado de uma velhice prematura das oliveiras e ausência de passarinhos e lagartixas e de todos os restantes companheiros, vítimas desta alienação destravada do homem, que conduz à autodestruição em nome da sobrevivência.

Que é preciso fazer alguma coisa, é. Pela natureza. Pelo ambiente. Por nós. É preciso. Mas seguir caminhos ínvios não me parece ser o melhor para se chegar ao que é preciso.


 

 

 Outras notícias - Opinião


É um banco, talvez, feliz! - maria augusta torcato »  2024-11-14  »  Maria Augusta Torcato

É um banco, talvez, feliz!

Era uma vez um banco. Não. É um banco e um banco, talvez, feliz!

E não. Não é um banco dos que nos desassossegam pelo que nos custam e cobram, mas dos que nos permitem sossegar, descansar.
(ler mais...)


Mérito e inveja - jorge carreira maia »  2024-11-14  »  Jorge Carreira Maia

O milagre – a eventual vitória de Kamala Harris nas eleições norte-americanas – esteve longe, muito longe, de acontecer. Os americanos escolheram em consciência e disseram claramente o que queriam. Não votaram enganados ou iludidos; escolheram o pior porque queriam o pior.
(ler mais...)


O vómito »  2024-10-26  »  Hélder Dias

30 anos: o JT e a política - joão carlos lopes »  2024-09-30  »  João Carlos Lopes

Dir-se-ia que três décadas passaram num ápice. No entanto, foram cerca de 11 mil dias iguais a outros 11 mil dias dos que passaram e dos que hão-de vir. Temos, felizmente, uma concepção e uma percepção emocional da história, como se o corpo vivo da sociedade tivesse os mesmos humores da biologia humana.
(ler mais...)


Não tenho nada para dizer - carlos tomé »  2024-09-23  »  Carlos Tomé

Quando se pergunta a alguém, que nunca teve os holofotes apontados para si, se quer ser entrevistado para um jornal local ou regional, ele diz logo “Entrevistado? Mas não tenho nada para dizer!”.

 Essa é a resposta que surge mais vezes de gente que nunca teve possibilidade de dar a sua opinião ou de contar um episódio da sua vida, só porque acha que isso não é importante,

 Toda a gente está inundada pelos canhenhos oficiais do que é importante para a nossa vida e depois dessa verdadeira lavagem ao cérebro é mais que óbvio que o que dizem que é importante está lá por cima a cagar sentenças por tudo e por nada.
(ler mais...)


Três décadas a dar notícias - antónio gomes »  2024-09-23  »  António Gomes

Para lembrar o 30.º aniversário do renascimento do “Jornal Torrejano”, terei de começar, obrigatoriamente, lembrando aqui e homenageando com a devida humildade, o Joaquim da Silva Lopes, infelizmente já falecido.
(ler mais...)


Numa floresta de lobos o Jornal Torrejano tem sido o seu Capuchinho Vermelho - antónio mário santos »  2024-09-23  »  António Mário Santos

Uma existência de trinta anos é um certificado de responsabilidade.

Um jornal adulto. Com tarimba, memória, provas dadas. Nasceu como uma urgência local duma informação séria, transparente, num concelho em que a informação era controlada pelo conservadorismo católico e o centrismo municipal subsidiado da Rádio Local.
(ler mais...)


Trente Glorieuses - carlos paiva »  2024-09-23  »  Carlos Paiva

Os gloriosos trinta, a expressão original onde me fui inspirar, tem pouco que ver com longevidade e muito com mudança, desenvolvimento, crescimento, progresso. Refere-se às três décadas pós segunda guerra mundial, em que a Europa galopou para se reconstruir, em mais dimensões que meramente a literal.
(ler mais...)


30 anos contra o silêncio - josé mota pereira »  2024-09-23  »  José Mota Pereira

Nos cerca de 900 anos de história, se dermos como assente que se esta se terá iniciado com as aventuras de D. Afonso Henriques nesta aba da Serra de Aire, os 30 anos de vida do “Jornal Torrejano”, são um tempo muito breve.
(ler mais...)


A dimensão intelectual da extrema-direita - jorge carreira maia »  2024-09-23  »  Jorge Carreira Maia

Quando se avalia o crescimento da extrema-direita, raramente se dá atenção à dimensão cultural. Esta é rasurada de imediato pois considera-se que quem apoia o populismo radical é, por natureza, inculto, crente em teorias da conspiração e se, por um acaso improvável, consegue distinguir o verdadeiro do falso, é para escolher o falso e escarnecer o verdadeiro.
(ler mais...)

 Mais lidas - Opinião (últimos 30 dias)
»  2024-11-14  »  Maria Augusta Torcato É um banco, talvez, feliz! - maria augusta torcato
»  2024-11-14  »  Jorge Carreira Maia Mérito e inveja - jorge carreira maia