Este é o meu único mundo! - antónio mário santos
Opinião » 2024-03-08 » António Mário Santos
Comentava João Carlos Lopes , no último Jornal Torrejano, de 16 de Fevereiro, sob o título Este Mundo e o Outro, partindo, quer do pessimismo nostálgico do Jorge Carreira Maia (Este não é o meu mundo), quer da importância da memória, em Maria Augusta Torcato, para resistir «à névoa que provoca o esquecimento e cegueira», quer «na militância política e cívica sempre empenhada», da minha autoria, num país do salve-se quem puder e do deixa andar, sempre à espera dum messias que resolva, por qualquer gesto milagreiro, a sua raiva abafada de nunca ser outra coisa que a imagem crónica de pobreza.
Quer nos citados, que no autor da crónica, há uma visão de desencanto do futuro, não apenas do país, mas da Europa. A sua evolução, no século XX, não foi brilhante: desde a primeira guerra mundial, colonizada pelos Estados Unidos da América, na economia, nas tecnologias, na cultura, na mentalização informativa dos media, assentes nos princípios neoliberais duma democracia que nunca conseguiu ultrapassar a consciência protestante da desigualdade, da xenofobia e do racismo, que lhe foi base de estrutura económica e social nas migrações dos colonizadores provenientes da Europa e, sobretudo, da Inglaterra.
Reconhece-se, por outro lado, que a desestabilização do ambiente planetário resulta da manutenção, há séculos, duma sociedade assente na acumulação do capital, na desigualdade do trabalho, no uso da mão de obra escrava ou sujeita ao limiar da miséria, que, nem o liberalismo do século XIX, nem as revoluções proletárias do século XX, conseguiram alterar de forma profunda.
Ainda hoje, EUA, Rússia e China, ditam as ordens dessas novas repúblicas de escassa democracia do designado Terceiro Mundo, onde às populações se coloca um dilema existencial: ou se submetem, ou emigram.
Percebo que a idade e a mudança vão gerando, sob a pressão crescente da inquietude e, mesmo, raiva, das juventudes sem nenhuma garantia duma vida decente, uma angústia existencial ante a visão dum mundo em que se acreditara poder viver em paz e com dignidade, se estar a desintegrar como um castelo da cartas.
Mas, tudo o que hoje acontece, era legível há mais de 30 anos. Os cientistas já então apontavam que a sociedade de consumo iria consumir tudo, degradar a possibilidade da vida planetária
O desencanto de hoje é o resultado duma opção mundial pela extracção, até ao impossível, dos recursos planetários, para satisfação dos prazeres comodistas das sociedades contemporâneas que, entregues aos seus lazeres, queriam melhores vencimentos, melhores casas, melhores automóveis, melhores instalações para férias, melhores produtos nas mesas das refeições, melhores instrumentos de comunicação e maior velocidade na transferência da informação.
Foi este desinteresse egoísta das classes médias que conduziu à sua própria sufocação. E viram os seus próprios filhos a sufocarem, devido às suas próprias opções. Criou-se uma juventude, como todas as outras, fruto das regras que, os que dominam, impõem à sociedade.
As de hoje, basicamente com o ensino secundário e, grande maioria, com o ensino superior, sente que o seu país lhe não dá as condições que desejam para viver com dignidade. E critica as gerações mais velhas por não conseguirem sair de casa dos pais, ou serem obrigados a emigrar por um vencimento melhor do que, para o mesmo trabalho, teriam na pátria. Optam por uma opção sem luta.
E os que usufruem das mordomias e dos empregos ambicionados, e criaram as regras para os mal pagos que lhes oferecem, saem a público em sua defesa, condenando o Estado, de que recebem a maioria dos rendimentos, que lhes permitem ser as elites num país à beira de colapso.
Se a educação dos jovens falhou no aspecto colectivo, não foi a escola a culpada, mas o que os pais intervenientes da sociedade portuguesa quiseram que a escola pública fosse: o local onde o seu filho tem de ser melhor que o filho do outro; onde se secundariza a solidariedade, o diálogo, o espírito crítico, o respeito pelo outro; onde o que vale é a classificação para a universidade, não o cidadão preparado para intervir activa e eficazmente na sociedade. O Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, tão próximo, quando ouvimos Trump e os seus acólitos da extrema direita espalhados pelo mundo e suportados por Putin. As elites a definirem as regras duma escola onde os seus filhos não andam…
Cuidado com as trombetas!
Já viram algum governante do mundo morrer, ou ficar amputado, ou cego, ou louco, nas guerras que forjam, no ódio que fomentam?
A minha geração nasceu numa ditadura, teve uma guerra colonial em África, durante doze anos, na defesa dos interesses de muito poucos. Conheceu o sofrimento, a doença, a perda de membros, a morte, mas também as prisões, o exílio, o silêncio e a perseguição no emprego.
Resistiu e mudou este país.
O seu lugar continua a ser onde se ama e se sofre, onde se combate e se luta pela democracia, a liberdade, a justiça, o direito à igualdade. Umas vezes recua-se, outras avança-se. Mas não há retrocesso. A vida é militância.
Este é o meu único mundo! - antónio mário santos
Opinião » 2024-03-08 » António Mário SantosComentava João Carlos Lopes , no último Jornal Torrejano, de 16 de Fevereiro, sob o título Este Mundo e o Outro, partindo, quer do pessimismo nostálgico do Jorge Carreira Maia (Este não é o meu mundo), quer da importância da memória, em Maria Augusta Torcato, para resistir «à névoa que provoca o esquecimento e cegueira», quer «na militância política e cívica sempre empenhada», da minha autoria, num país do salve-se quem puder e do deixa andar, sempre à espera dum messias que resolva, por qualquer gesto milagreiro, a sua raiva abafada de nunca ser outra coisa que a imagem crónica de pobreza.
Quer nos citados, que no autor da crónica, há uma visão de desencanto do futuro, não apenas do país, mas da Europa. A sua evolução, no século XX, não foi brilhante: desde a primeira guerra mundial, colonizada pelos Estados Unidos da América, na economia, nas tecnologias, na cultura, na mentalização informativa dos media, assentes nos princípios neoliberais duma democracia que nunca conseguiu ultrapassar a consciência protestante da desigualdade, da xenofobia e do racismo, que lhe foi base de estrutura económica e social nas migrações dos colonizadores provenientes da Europa e, sobretudo, da Inglaterra.
Reconhece-se, por outro lado, que a desestabilização do ambiente planetário resulta da manutenção, há séculos, duma sociedade assente na acumulação do capital, na desigualdade do trabalho, no uso da mão de obra escrava ou sujeita ao limiar da miséria, que, nem o liberalismo do século XIX, nem as revoluções proletárias do século XX, conseguiram alterar de forma profunda.
Ainda hoje, EUA, Rússia e China, ditam as ordens dessas novas repúblicas de escassa democracia do designado Terceiro Mundo, onde às populações se coloca um dilema existencial: ou se submetem, ou emigram.
Percebo que a idade e a mudança vão gerando, sob a pressão crescente da inquietude e, mesmo, raiva, das juventudes sem nenhuma garantia duma vida decente, uma angústia existencial ante a visão dum mundo em que se acreditara poder viver em paz e com dignidade, se estar a desintegrar como um castelo da cartas.
Mas, tudo o que hoje acontece, era legível há mais de 30 anos. Os cientistas já então apontavam que a sociedade de consumo iria consumir tudo, degradar a possibilidade da vida planetária
O desencanto de hoje é o resultado duma opção mundial pela extracção, até ao impossível, dos recursos planetários, para satisfação dos prazeres comodistas das sociedades contemporâneas que, entregues aos seus lazeres, queriam melhores vencimentos, melhores casas, melhores automóveis, melhores instalações para férias, melhores produtos nas mesas das refeições, melhores instrumentos de comunicação e maior velocidade na transferência da informação.
Foi este desinteresse egoísta das classes médias que conduziu à sua própria sufocação. E viram os seus próprios filhos a sufocarem, devido às suas próprias opções. Criou-se uma juventude, como todas as outras, fruto das regras que, os que dominam, impõem à sociedade.
As de hoje, basicamente com o ensino secundário e, grande maioria, com o ensino superior, sente que o seu país lhe não dá as condições que desejam para viver com dignidade. E critica as gerações mais velhas por não conseguirem sair de casa dos pais, ou serem obrigados a emigrar por um vencimento melhor do que, para o mesmo trabalho, teriam na pátria. Optam por uma opção sem luta.
E os que usufruem das mordomias e dos empregos ambicionados, e criaram as regras para os mal pagos que lhes oferecem, saem a público em sua defesa, condenando o Estado, de que recebem a maioria dos rendimentos, que lhes permitem ser as elites num país à beira de colapso.
Se a educação dos jovens falhou no aspecto colectivo, não foi a escola a culpada, mas o que os pais intervenientes da sociedade portuguesa quiseram que a escola pública fosse: o local onde o seu filho tem de ser melhor que o filho do outro; onde se secundariza a solidariedade, o diálogo, o espírito crítico, o respeito pelo outro; onde o que vale é a classificação para a universidade, não o cidadão preparado para intervir activa e eficazmente na sociedade. O Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, tão próximo, quando ouvimos Trump e os seus acólitos da extrema direita espalhados pelo mundo e suportados por Putin. As elites a definirem as regras duma escola onde os seus filhos não andam…
Cuidado com as trombetas!
Já viram algum governante do mundo morrer, ou ficar amputado, ou cego, ou louco, nas guerras que forjam, no ódio que fomentam?
A minha geração nasceu numa ditadura, teve uma guerra colonial em África, durante doze anos, na defesa dos interesses de muito poucos. Conheceu o sofrimento, a doença, a perda de membros, a morte, mas também as prisões, o exílio, o silêncio e a perseguição no emprego.
Resistiu e mudou este país.
O seu lugar continua a ser onde se ama e se sofre, onde se combate e se luta pela democracia, a liberdade, a justiça, o direito à igualdade. Umas vezes recua-se, outras avança-se. Mas não há retrocesso. A vida é militância.
É um banco, talvez, feliz! - maria augusta torcato » 2024-11-14 » Maria Augusta Torcato É um banco, talvez, feliz! Era uma vez um banco. Não. É um banco e um banco, talvez, feliz! E não. Não é um banco dos que nos desassossegam pelo que nos custam e cobram, mas dos que nos permitem sossegar, descansar. |
Mérito e inveja - jorge carreira maia » 2024-11-14 » Jorge Carreira Maia O milagre – a eventual vitória de Kamala Harris nas eleições norte-americanas – esteve longe, muito longe, de acontecer. Os americanos escolheram em consciência e disseram claramente o que queriam. Não votaram enganados ou iludidos; escolheram o pior porque queriam o pior. |
O vómito » 2024-10-26 » Hélder Dias |
30 anos: o JT e a política - joão carlos lopes » 2024-09-30 » João Carlos Lopes Dir-se-ia que três décadas passaram num ápice. No entanto, foram cerca de 11 mil dias iguais a outros 11 mil dias dos que passaram e dos que hão-de vir. Temos, felizmente, uma concepção e uma percepção emocional da história, como se o corpo vivo da sociedade tivesse os mesmos humores da biologia humana. |
Não tenho nada para dizer - carlos tomé » 2024-09-23 » Carlos Tomé Quando se pergunta a alguém, que nunca teve os holofotes apontados para si, se quer ser entrevistado para um jornal local ou regional, ele diz logo “Entrevistado? Mas não tenho nada para dizer!”. Essa é a resposta que surge mais vezes de gente que nunca teve possibilidade de dar a sua opinião ou de contar um episódio da sua vida, só porque acha que isso não é importante, Toda a gente está inundada pelos canhenhos oficiais do que é importante para a nossa vida e depois dessa verdadeira lavagem ao cérebro é mais que óbvio que o que dizem que é importante está lá por cima a cagar sentenças por tudo e por nada. |
Três décadas a dar notícias - antónio gomes » 2024-09-23 » António Gomes Para lembrar o 30.º aniversário do renascimento do “Jornal Torrejano”, terei de começar, obrigatoriamente, lembrando aqui e homenageando com a devida humildade, o Joaquim da Silva Lopes, infelizmente já falecido. |
Numa floresta de lobos o Jornal Torrejano tem sido o seu Capuchinho Vermelho - antónio mário santos » 2024-09-23 » António Mário Santos Uma existência de trinta anos é um certificado de responsabilidade. Um jornal adulto. Com tarimba, memória, provas dadas. Nasceu como uma urgência local duma informação séria, transparente, num concelho em que a informação era controlada pelo conservadorismo católico e o centrismo municipal subsidiado da Rádio Local. |
Trente Glorieuses - carlos paiva » 2024-09-23 » Carlos Paiva Os gloriosos trinta, a expressão original onde me fui inspirar, tem pouco que ver com longevidade e muito com mudança, desenvolvimento, crescimento, progresso. Refere-se às três décadas pós segunda guerra mundial, em que a Europa galopou para se reconstruir, em mais dimensões que meramente a literal. |
30 anos contra o silêncio - josé mota pereira » 2024-09-23 » José Mota Pereira Nos cerca de 900 anos de história, se dermos como assente que se esta se terá iniciado com as aventuras de D. Afonso Henriques nesta aba da Serra de Aire, os 30 anos de vida do “Jornal Torrejano”, são um tempo muito breve. |
A dimensão intelectual da extrema-direita - jorge carreira maia » 2024-09-23 » Jorge Carreira Maia Quando se avalia o crescimento da extrema-direita, raramente se dá atenção à dimensão cultural. Esta é rasurada de imediato pois considera-se que quem apoia o populismo radical é, por natureza, inculto, crente em teorias da conspiração e se, por um acaso improvável, consegue distinguir o verdadeiro do falso, é para escolher o falso e escarnecer o verdadeiro. |
» 2024-11-14
» Maria Augusta Torcato
É um banco, talvez, feliz! - maria augusta torcato |
» 2024-11-14
» Jorge Carreira Maia
Mérito e inveja - jorge carreira maia |