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A "ternura" dos quarenta

Opinião  »  2014-04-24  »  Manuel Filipe

A comemoração dos quarenta anos da revolução de abril é feita com um trago de amargura. A crise, que tomou conta do país, atesta que nem tudo esteve bem no caminho trilhado desde então. Mas, talvez pior, o futuro que se anuncia não se prevê nada sorridente. Longe disso.

O empobrecimento a que se está a submeter o povo português é a denegação primária dos princípios da democracia. A dignidade do ser humano é cada dia vendida ao primado económico que, devendo servir o homem, conseguiu por o homem a servi-lo. As pessoas trabalham mais, ganham menos, pagam mais, vivem pior. E a política, que abril pintou de esperança, não se pode desculpar de ter contribuído para esse estado de coisas. Por isso, e porque política deixou de ser esperança para o povo, as pessoas vão deixando de votar. Abstêm-se. Desinteressam-se. Salva-se a liberdade, mas até já sugerem que se obrigue o povo a votar. Estranha liberdade…

Quarenta anos de democracia atestam a estabilidade conseguida. Contudo, nem tudo significa sucesso. A sociedade portuguesa regista ainda grandes assimetrias sociais e económicas. A democratização do país não foi suficiente para colmatar o défice de justiça social em que historicamente estávamos enraizados. E a adesão à Europa civilizada não modernizou o país como se pretendia, nem, muito menos, contribuiu para uma divisão mais justa e equilibrada da riqueza produzida. Culpa de quem? Do Estado, sem dúvida, embora ele seja uma entidade demasiado vaga e abrangente para, em concreto, se poder dizer que determinado setor (o ensino, a saúde, a justiça, ou outro) teve mais responsabilidade que os restantes. Mas também da sociedade civil, da iniciativa privada que, pasme-se, fica sempre livre de toda e qualquer responsabilidade nesta e noutras áreas sempre que se prestam contas. E, contudo, a sociedade civil e a iniciativa privada têm recebido milhares de milhões de euros de apoios que ninguém refere, que ninguém contabiliza, de que ninguém até agora fez um balanço adequado. Por tudo isso, interessa a alguns olhar para o Estado como único responsável de todo esse fracasso.

Com base nessa premissa ideológica, conclui-se pela, e delineia-se por essa lógica, reforma do Estado. Que mais não é que a sujeição do Estado ao primado económico. Livrar o Estado das funções sociais que lhe competem é descaracterizar esse mesmo Estado. Entregar a privados a função educacional e a saúde é, acima de tudo, sujeitar duas áreas fundamentais à lógica do lucro. Porque, reconheça-se, a iniciativa privada precisa do lucro. Por isso ”engana” o Estado. E a denúncia recente de casos de fraude ao Estado e de incumprimento de compromissos justamente por empresas privadas que atuam nestas duas áreas, o ensino e a saúde, deixam imensas suspeitas no ar e levam-nos a temer pela entrega, de mão beijada, destas duas áreas ao setor privado.

Poderia, em contrapartida, pensar-se que na esfera do Estado ficaria uma Justiça forte, independente, capaz de regular todo esse fluxo de interesses e de obrigações. Mas a Justiça que conhecemos e que se dá a conhecer, por culpa própria ou de outrem, é tudo menos isso. As situações que quase diariamente vêm a público revelam um estado da Justiça preocupante, sobretudo quando se trata de casos mediáticos, envolvendo figuras poderosas, e que acabam quase sempre de forma pouco clara ou com processos prescritos. Com isso, não deixa de se acentuar sempre aquela velha suspeita de que a Justiça funciona apenas para alguns, continuando os poderosos a escapar ilesos ao poder de uma lei que deveria ser igual para todos. A Justiça não tem que ser popular e simplista, mas precisa de ser minimamente compreendida pela cidadão comum de forma a que possa merecer, da parte de todos, o respeito e a confiança que consubstanciam a sua necessária independência.

É por isso que, no contexto em que vivemos e com a perspetiva do futuro que se vem traçando, a celebração dos quarenta anos da revolução dos cravos tem um travo de amargura. Muito do sonho ficou para trás. Há muito retrocesso nas opções que se estão a tomar. E quando o aniversário evoca, em melodia, a ”ternura dos quarenta”, não deixa de fazer sentido que essa ternura tenha mais a ver, não com o aniversariante, mas com o ”desaniversariante”. Há um certo conservadorismo triunfante que se está a promover, há um elitismo emergente que se está a instalar, há uma certa classe que está a construir, de novo, o seu apogeu num país onde quem pretende singrar tem, como outrora, de emigrar. Tudo com a ternura de um povo que, com quarenta anos de democracia, parece cansado de tudo e incapaz de reagir ou, simplesmente, porque está à espera que outros reajam. Como há quarenta anos atrás…

 

 

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