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Quem está mal, mude-se - joão carlos lopes

Opinião  »  2023-06-08 

1. Santo António era, na verdade, uma pequena aldeia, um alinhamento de casas que se foi somando ao longo da medieval “estrada de Alcorochel”, bem na periferia da vila. No final do século XX, a gente mais velha ainda dizia que ia à vila, que começava a meio da ladeira de Santiago. O bairro só não tinha farmácia, porque não era permitida, mas comprava-se tudo nas mercearias da Adelaide e do Zé Rosa, o pão no Chico Jerónimo, petiscava-se na taberna do Sequeira ou no Mal Atilado, ia-se à carne fresca ao talho da Rata, mesmo ao fim da rua, havia alfaiate, costureiras e sapateiros, cortava-se o cabelo no Rei Piolho. E fazia-se a festa, porque no bairro um elo forte ligava vizinhos e conhecidos (hoje diz-se identidade e sociabilidades), coisa que não acontecia tanto nos outros bairros da vila. Para haver festa é preciso haver povo que a faça. Ao pé das intermitências festivas do Vale e de São Pedro, a festa de Santo António afirmava-se como a grande festa popular de Torres Novas, porque era o povo do bairro que a fazia. Passaram-se mais de 100 anos desde que há memória da primeira festa, organizada nestes moldes de festa popular. O bairro mudou, se calhar mais que o mundo. Há uma réstia de memória do que representou a festa para várias gerações de jovens e este ano ela regressa depois da paragem imposta pela moléstia que se abateu sobre o mundo. Saúde-se a coragem de quem a vai pôr de pé.

2. A alegria melancólica, auto-programada, ostensiva e insuportavelmente ruidosa, disfarçando um silêncio interior que esconde a quebra de um elo que antigamente ligava o povo do futebol aos seus heróis, aqueles que envergavam décadas a mesma camisola, fez-se sentir mais uma vez por todo o país e também em Torres Novas. Venderam-se os afectos (serão afectos?) a uma rede universal de mercenários da bola que capturou os clubes de futebol e os descarnou daquilo que os ligava às suas cidades, aos seus países, aos seus adeptos. É bizarro ver os corações das cidades invadido por essa alegria plastificada, histérica e amarga. Um dia depois, muitas centenas de torrejanos deslocaram-se ao Cartaxo para aplaudir e vitoriar uma pobre equipa formada por jovens que a gente conhece, filhos dos nossos amigos e vizinhos, arrastando atrás de si namoradas e companheiros de trabalho ou de escola, pais e avós, numa alegria, essa sim afectuosa, porque nada tem a perder uma equipa que é rica naquelas dimensões da vida das comunidades que precisam de continuar a ser comunidades e não apenas amontoados de gente. A taça trazida na bagagem é uma lição (e um aviso) àqueles que conseguem gastar 150 euros várias vezes por ano para ir a Lisboa ver um jogo de futebol e alimentar uma máquina global de esbulho a soldo de interesses obscuros, e não podem pagar dois euros de quota mensal para ajudarem o clube da sua terra. Que já conhecem, quando acham que têm em casa um potencial Maradonazinho e vão a correr com o menino ao clube da terra ver se o miúdo dá mesmo para a bola.

3. De proximidade se fazem e se alimentam as comunidades, dos gestos de pertença e de aposta numa qualquer esperança, mesmo quando ela não é uma certeza. São pequenos sinais de resistência, esses também, à moléstia global que faz querer vestir tudo igual, comer tudo igual, pensar tudo igual, com conluio dos poderes locais, perante promessas de miríficas “criações de emprego” que nunca são aquilo que se diz e que se reduzem, passado o teatro para a fotografia, a meia dúzia de empregos precários e mal pagos. O pão da “Rama”, as saladas e sumos do “Jasmim”, agora uma loja de desporto a enfrentar os gigantes da distribuição, mesmo no coração do centro histórico da vila, são riscos impressivos na superfície árida onde tudo o que era de outro tempo parece desaparecer entre ruínas.

4. Os prémios são aquilo que são, como se diz quando não se sabe dizer mais alguma coisa que valha a pena: Abrantes, mais de uma década e cerca de 8 milhões de euros depois, ganhou o prémio de Museu do Ano com o seu novo Museu Ibérico de Arte e Arqueologia. Aliás, já tinha ganho idêntico prémio, há poucos anos, com o Museu MDF do Tramagal. Independente da coerência conceptual do novo museu, isto é um facto: a aposta de Abrantes no património e na arte tem sido uma estratégia definida, assumida e levada a sério, sem trambolhões e sem recuos. Brevemente, anuncia-se a abertura de mais um museu, o Museu de Arte Contemporânea Charters de Almeida. Parabéns a Abrantes. Para Torres Novas, veio uma menção honrosa na categoria de restauro do património, pelo trabalho feito na requalificação das máquinas da Central do Caldeirão. Saúdem-se igualmente todos quantos se empenharam no projecto.

5. Abrantes passa a ter uma rede patrimonial invejável. Santarém, dotada de um imenso património e cidade de potencialidades invejáveis, não tem um museu de jeito, queixam-se desde sempre os scalabitanos. Mas pôde derreter 38 mil euros dos contribuintes em croquetes na apresentação do projecto do putativo aeroporto que ninguém pediu para a região e que, oremos, mesmo nós os não crentes, semelhante “projecto” não passe de uma intenção de quem não teve mandato para a defender. Os autarcas que querem a todo o custo o aeroporto ao pé da porta, se querem mesmo ver passar os aviões, comprem casa nas avenidas novas ou na Portela. Quem está mal, mude-se, é caso para dizer.

 

 

 

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