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Todos os Nomes - josé ricardo costa

Opinião  »  2024-05-25  »  José Ricardo Costa

O tamanho importa? Bom, se nalguns campos as opiniões se dividem, outros há que são consensuais, como o tamanho dos nomes de pessoas. Importa, sim, desde logo na Roma Antiga: enquanto um homem podia ter três nomes, a mulher só tinha direito a um, ainda por cima variante do nome do pai (Hortênsia seria filha de Hortensius). Depois, como sinal de distinção social, embora com possíveis efeitos secundários como começar a ler o nome completo de um rei e adormecer antes de chegar ao fim.

Já estive numa escola cuja representante dos pais tinha dez nomes, uma espécie de versão onomástica dos oito metros de Economia Política na biblioteca do Jacinto de A Cidade e as Serras. Com nomes não dá para dizer que à dúzia é mais barato, pelo contrário, até os encarece bastante. Daí, ao iniciar um mail, o meu cumprimento variar consoante o comprimento do nome do destinatário. Se tiver quatro nomes (o mais comum em Portugal) digo “Olá Manuel”, se tiver cinco, já passa a “Caro Manuel”. Só mesmo a partir de cinco é que já me curvo ante um “Caríssimo Manuel”, inflacionando assim o cumprimento.

Quando se trata de escolher um “nome público”, o habitual é serem dois, ou vá, três. Daí a minha surpresa quando soube de um poeta chamado João Miguel Fernandes Jorge, nome que é quase do tamanho de um haikai. Imagine-se o que seria a literatura portuguesa cheia de nomes como Herberto Helder Bernardes de Oliveira ou Ruy de Moura Ribeiro Belo. Até José Saramago, que escreveu um livro chamado Todos os Nomes, dispensou um deles apesar de ter só três.

É verdade que há a Sophia de Mello Breyner Andresen, mas compreende-se aqui a irresistível tentação de não deitar fora o pedigree de dois apelidos estrangeiros mais um português com duplo L que combina na perfeição com um PH alcalino, excelente para remover quaisquer laivos de mediania social. Ou a Fiama Hasse Pais Brandão mas, neste caso, o nome só por si já é uma obra literária.

Eu por acaso até escolhi três nomes, mas só por “José Costa” ser o nome por que sou conhecido na Ryanair, nos mails de spam ou naqueles telefonemas que servem para impingir colchões, o que tem o seu quê de irritante. Fosse, em vez de Costa, Wallenstsein, e nem pensaria duas vezes! E o que não falta é gente importante só com um nome, embora gravado a ouro: Camões, Shakespeare, Cervantes, Baudelaire, Eusébio.

Daí o meu espanto ao descobrir, em Torres Novas, uma rua Joaquim Alberto Godinho Pereira da Rosa. Não por Joaquim Godinho ter nome de rua, mas por chamarem Joaquim Alberto Godinho Pereira da Rosa à rua de Joaquim Godinho. Terêncio, escritor romano, dizia que nada do que é humano lhe era estranho. Já eu, por mais que viva, não paro de me surpreender, neste caso em particular com a mente de onde brotou tal desvario toponímico.

Eu gostaria de não ter de fazer um desenho, mas também fica difícil não ter de lembrar que o nome Joaquim Alberto Godinho Pereira da Rosa só era necessário ao próprio para preencher documentos. Se há uma rua Alexandre Herculano em vez de Alexandre Herculano de Carvalho e Araújo, ou um largo General Baracho em vez de General Sebastião de Sousa Dantas Baracho, que mal terá feito Joaquim Godinho para a sua rua não se chamar Joaquim Godinho?

Poderia ser um pletórico excesso barroco em forma de nome, mas não passa de um artifício kitsch de alguém que talvez acredite que a homenagem será tanto maior quanto mais centímetros de nome apresentar, receando que uma rua Joaquim Godinho para homenagear Joaquim Godinho ficasse aquém do seu valor.

Ao contrário do que muitas vezes se pensa, kitsch não é sinónimo de piroso, apenas poderão coincidir. Há coisas pirosas que são kitsch e outras que não são kitsch, como há coisas kitsch que são pirosas e outras que não são. Neste caso, o kitsch neste nome de rua de um homem que não merecia a desfeita, não é bem piroso, nem pindérico, nem possidónio, três categorias estéticas distintas, embora ande perto das três. Sobretudo pela sua grandiosidade vazia, um ostensivo brilho de lantejoulas que anula o sóbrio respeito e consideração por alguém que mereceu ter nome de rua.

A arte pública em Portugal é, de um modo geral, uma catástrofe. Agora, pelos vistos, nem os nomes de ruas escapam. Para terminar, apenas expressar a minha solidariedade às pessoas que lá moram, condenadas a escrever todos aqueles nomes sempre que tiverem de preencher documentos.

 

 

 

 

 

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