Não (h)à crise - carlos paiva
"“Incrível como um heróico empresário português decalca na perfeição, à distância de 27 anos, um caralho voador num disco intitulado Rei Por Um Dia, Tolo Por uma Vida Inteira."
Conto com mais de meio século de existência e não conheço Portugal sem estar em crise. Este estado perpétuo instalou-se no subconsciente colectivo, sendo aceite como a normalidade. Curioso como regularmente o governo nos educa para novas normalidades.
Ali por meados de ’80, os restaurantes apresentavam no menu um prato com esse mesmo nome: crise. Era o mais barato da lista, consistindo numa omelete acompanhada de batatas fritas, com sorte, também uma porção de arroz.
O sentido de oportunidade, e de humor, não enchia a barriga, estando apenas uns furos acima do último recurso do teso esfomeado, a lata de atum. Pelo estômago cheio de crises, cozinhadas por governos frequentemente incompetentes e quase sempre corruptos, a desconfiança perante tudo o que fosse Estado também se instalou no subconsciente colectivo.
Assim se desenvolveu o tecido empresarial português, pautado pela fuga aos impostos e pelo usufruto pessoal de subsídios externos debilmente fiscalizados, como convinha. Qual remake da lenda da sopa da pedra, as pontuais fiscalizações invariavelmente esbarram na paupérrima miséria dos empresários com nada a seu nome. Apesar das empresas, ano após ano, apresentarem prejuízos, continuam em funcionamento como por magia. As mansões em nome dos gatos, os carros de luxo em nome dos cães, as contas bancárias no estrangeiro em nome dos periquitos. Se os empresários fazem uma vida espartana a mesma coisa já não se pode dizer dos seus animaizinhos de estimação.
Quem mais fugisse aos impostos, quem mais enganasse o Estado, era admirado, aplaudido e visto como pessoa muito inteligente, com visão, empresário de sucesso, um exemplo a seguir. Sendo o pagamento de impostos a contribuição social base da estrutura organizativa a que pertencemos, o povo aplaude e idolatra o nó corrediço cada vez mais apertado no seu pescoço. As dívidas à segurança social foram muitas vezes objecto de chantagem clara, à luz do dia: “Preferem que mande 200 trabalhadores para a rua, para serem sustentados pela segurança social, ou preferem que eu continue em funcionamento e vá pagando a dívida como e quando eu quiser?” E outros golpes de absoluta genialidade por gestores heroicos, preocupados com a sobrevivência e bem-estar dos seus trabalhadores, os tais que os idolatram.
Nascidos e criados num ecossistema com estas características, não é de admirar que o povo, mais uma vez, idolatre um milionário que esbanja uma pequena fortuna num capricho de pouco mais de dez minutos, elevando-o à categoria de herói. De tripulante num caralho voador, a estrela mediática, herói nacional. Por muito que me agrade ficar com os créditos da expressão, caralho voador (quem me conhece sabe que assenta que nem um preservativo justinho ao meu léxico), não posso.
Numa premonição incrivelmente acertada, os Faith No More anteciparam-se e, no seu álbum de 1995, King For a Day, Fool For a Lifetime, incluíram uma canção com esse título. Incrível como um heróico empresário português decalca na perfeição, à distância de 27 anos, um caralho voador num disco intitulado Rei Por Um Dia, Tolo Por uma Vida Inteira. Esta precisão não pode ser mera coincidência. Magia. Pura magia.
Não (h)à crise - carlos paiva
“Incrível como um heróico empresário português decalca na perfeição, à distância de 27 anos, um caralho voador num disco intitulado Rei Por Um Dia, Tolo Por uma Vida Inteira.
Conto com mais de meio século de existência e não conheço Portugal sem estar em crise. Este estado perpétuo instalou-se no subconsciente colectivo, sendo aceite como a normalidade. Curioso como regularmente o governo nos educa para novas normalidades.
Ali por meados de ’80, os restaurantes apresentavam no menu um prato com esse mesmo nome: crise. Era o mais barato da lista, consistindo numa omelete acompanhada de batatas fritas, com sorte, também uma porção de arroz.
O sentido de oportunidade, e de humor, não enchia a barriga, estando apenas uns furos acima do último recurso do teso esfomeado, a lata de atum. Pelo estômago cheio de crises, cozinhadas por governos frequentemente incompetentes e quase sempre corruptos, a desconfiança perante tudo o que fosse Estado também se instalou no subconsciente colectivo.
Assim se desenvolveu o tecido empresarial português, pautado pela fuga aos impostos e pelo usufruto pessoal de subsídios externos debilmente fiscalizados, como convinha. Qual remake da lenda da sopa da pedra, as pontuais fiscalizações invariavelmente esbarram na paupérrima miséria dos empresários com nada a seu nome. Apesar das empresas, ano após ano, apresentarem prejuízos, continuam em funcionamento como por magia. As mansões em nome dos gatos, os carros de luxo em nome dos cães, as contas bancárias no estrangeiro em nome dos periquitos. Se os empresários fazem uma vida espartana a mesma coisa já não se pode dizer dos seus animaizinhos de estimação.
Quem mais fugisse aos impostos, quem mais enganasse o Estado, era admirado, aplaudido e visto como pessoa muito inteligente, com visão, empresário de sucesso, um exemplo a seguir. Sendo o pagamento de impostos a contribuição social base da estrutura organizativa a que pertencemos, o povo aplaude e idolatra o nó corrediço cada vez mais apertado no seu pescoço. As dívidas à segurança social foram muitas vezes objecto de chantagem clara, à luz do dia: “Preferem que mande 200 trabalhadores para a rua, para serem sustentados pela segurança social, ou preferem que eu continue em funcionamento e vá pagando a dívida como e quando eu quiser?” E outros golpes de absoluta genialidade por gestores heroicos, preocupados com a sobrevivência e bem-estar dos seus trabalhadores, os tais que os idolatram.
Nascidos e criados num ecossistema com estas características, não é de admirar que o povo, mais uma vez, idolatre um milionário que esbanja uma pequena fortuna num capricho de pouco mais de dez minutos, elevando-o à categoria de herói. De tripulante num caralho voador, a estrela mediática, herói nacional. Por muito que me agrade ficar com os créditos da expressão, caralho voador (quem me conhece sabe que assenta que nem um preservativo justinho ao meu léxico), não posso.
Numa premonição incrivelmente acertada, os Faith No More anteciparam-se e, no seu álbum de 1995, King For a Day, Fool For a Lifetime, incluíram uma canção com esse título. Incrível como um heróico empresário português decalca na perfeição, à distância de 27 anos, um caralho voador num disco intitulado Rei Por Um Dia, Tolo Por uma Vida Inteira. Esta precisão não pode ser mera coincidência. Magia. Pura magia.
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![]() “Pobre é o discípulo que não excede o seu mestre” Leonardo da Vinci
Mais do que rumor, é já certo que a IA é capaz de usar linguagem ininteligível para os humanos com o objectivo de ser mais eficaz. |
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Em 2012, o psicólogo social Jonathan Haidt publicou a obra A Mente Justa: Porque as Pessoas Boas não se Entendem sobre Política e Religião. Esta obra é fundamental porque nos ajuda a compreender um dos dramas que assolam os países ocidentais, cujas democracias se estruturam, ainda hoje, pela dicotomia esquerda–direita. |
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![]() "Hire a clown, get a circus" * Ele é antissistema. Prometeu limpar o aparelho político de toda a corrupção. Não tem filtros e, como o povo gosta, “chama os bois pelo nome”, não poupando pessoas ou entidades. |
![]() A eleição de um novo Papa é um acontecimento sempre marcante, apesar de se viver, na Europa, em sociedades cada vez mais estranhas ao cristianismo. Uma das grandes preocupações, antes, durante e após a eleição de Leão XIV, era se o sucessor de Francisco seria conservador ou progressista. |
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