DOIS LIVROS, MUITOS MOMENTOS - josé alves pereira
"“Estes são livros essenciais que nos ajudam a revelar quem foi quem nos trilhos da resistência antifascista, transportando-nos para as imagens e dramas de um outro tempo histórico e social."
Abordo, de forma breve, dois livros que já este ano foram apresentados em Torres Novas, assinalando trabalhos que penso indesculpável deixar sem uma referência pública.
1. Começo pelo “COMUNISTAS, uma história do PCP em Torres Novas“, da autoria de João Carlos Lopes. O autor possui já uma bibliografia de publicações que é relevante. O livro que aqui nos importa reporta-se ao período desde a criação do PCP em 1921, com os primeiros e incipientes passos de torrejanos, até ao 25 de Abril de 1974 com outros comunistas e companheiros de resistência de áreas ideológicas diferentes. O vasto auditório presente na apresentação, na praça dos Claras, era bem o testemunho do quanto aquela obra tocava ainda as memórias de muitos dos assistentes. Apesar de ter por referência o caminho dos comunistas torrejanos durante a resistência antifascista, a diversidade democrática ali vista atesta com clareza a unidade de objectivos, a solidariedade e a cumplicidade que então tantos unia nessa luta comum pela liberdade. O autor leva a cabo uma investigação cuidadosa dos percursos do PCP e lutadores antifascistas em Torres Novas mas igualmente dos muitos, nem todos comunistas, que em tempos vários calcorrearam os duros trilhos da resistência e foram vítimas da repressão do regime. Das décadas mais recentes de antes de Abril de 1974, dado que alguns dos depoentes ainda por cá andam, foi possível relembrar alguns momentos de que foram parte activa. Esses depoimentos não são “interpretações” dos intervenientes, mas descrições factuais sujeitas a imprecisões, seja pelo tempo já transcorrido seja pelo carácter mais ou menos condicionado da vivência em semi-clandestinidade. Com este livro percorremos através das fotografias de pessoas e documentos alguns dos negros dias da vida de muitos cidadãos torrejanos, desvendando factos ignorados pela historiografia oficial. O autor, além da investigação que contextualiza os elementos históricos, locais e nacionais, recorre a inquéritos e depoimentos, escritos e orais, que clarificam igualmente a importância dos movimentos associativos e culturais que antecederam o 25 de Abril. Ficaria todavia incompleto o quadro, sem a referência, ainda que breve, aos que na imprensa local e no poder político ilegítimo foram colaborantes ideológicos e institucionais do ambiente obscurantista em que o país e Torres Novas viviam. Um livro determinante na compreensão do quadro social vivido durante décadas, essencialmente no mundo operário, mas de modo esclarecedor a resistência e os dias sombrios das famílias atingidas pelas carências materiais de um quotidiano incerto além das idas sofridas ao tribunal plenário da Boa-Hora ou aos fortes de Caxias e Peniche. 53 anos de resistência, dezenas de prisões e cerca de 100 anos de cadeia é o que estas páginas nos recordam. “COMUNISTAS, uma história do PCP em Torres Novas” é um livro escorreito, fruto de persistente e profícuo trabalho do João Carlos Lopes, nem apologético nem preconceituoso, numa linguagem o mais possível vinculada aos factos exaustivamente investigados.
2. Um outro livro apresentado na biblioteca de Torres Novas foi “TERRA VELHA” com autoria de José Manuel Bento Sampaio. O autor, sendo natural de Almeirim, mantém com a sociedade torrejana uma larga convivência, desde as actividades desenvolvidas pela oposição democrática antes do 25 de Abril até à prática profissional de médico-pediatra que culminaram como director do hospital local.
O livro “TERRA VELHA” tem por centro da narrativa a saga, real, vivida por centenas de rendeiros da zona de Almeirim em 1973, mas com antecedentes históricos mais profundos. O desenvolvimento literário apresenta-se em forma de peça ficcional teatralizada, o que desde logo confere um grau de complexidade na sua avaliação por quem, como é o caso do autor destas linhas, se situa nessa área mais com a sensibilidade de um espectador do que com a capacidade de avaliar os contextos da teatralidade. O autor dá-se ao detalhe, cuidadoso mas arrojado, de propor sugestões de encenação e enquadramentos cenográficos. A peça inicia-se em meados de Julho de 1973 na taberna/mercearia do Serapião, em Alterim, onde se encontram reunidos vários rendeiros para analisar o que fazer perante a pretensão dos proprietários das terras em aumentar as rendas para valores considerados incomportáveis. As ameaças de despejos são o horizonte próximo. Alguns já haviam desistido, outros viam o seu futuro próximo muito incerto. Pelas falas dos presentes, o autor faz-nos passear pelas memórias de outras lutas, desde as praças de jorna às conquistas das 8 horas de trabalho, desde o assassinato de Catarina Eufémia aos dramas da emigração, etc. Os rendeiros aguardam a chegada do jovem Alberto, estudante e jovem militante clandestino do PCP, que o livro não refere mas se subentende ser o próprio autor. Chegado este e discutido o problema é redigido, por Alberto, e assinado por mais de 100 rendeiros, um documento dirigido ao governo de Marcelo Caetano em que expõem o seu drama. Com “eleições” em Outubro, o tema fica a aguardar melhor ocasião. Em 25 de Abril de 1974 Portugal perspectiva caminhos de maior justiça e é a vez dos proprietários das terras ensejarem outras soluções, mais consentâneas com os novos ares. Desses tempos se dá conta o livro “TERRA VELHA”, seja através das reuniões expressas na ficção teatral seja no vasto acervo documental que completam a obra e dão suporte à sua contextualização nos tempos políticos de antes e após Abril. A oralidade e expressões dos personagens/rendeiros revelam a identificação do José Manuel Sampaio, com o ambiente em que decorre a acção, com traços de algum neorrealismo literário. Costuma dizer-se que uns fazem a história e outros escrevem-na, embora com isso estejam também a fazer a história do tempo em que a escrevem. Neste “TERRA VELHA” autor e participante nos acontecimentos cruzam-se.
Com especificidades diferentes, estes são livros essenciais que nos ajudam a revelar quem foi quem nos trilhos da resistência antifascista, transportando-nos para as imagens e dramas de um outro tempo histórico e social. Parabéns aos autores e boa leitura a quem quiser conhecer um pouco mais dos passados que se vão escoando das nossas memórias.
DOIS LIVROS, MUITOS MOMENTOS - josé alves pereira
“Estes são livros essenciais que nos ajudam a revelar quem foi quem nos trilhos da resistência antifascista, transportando-nos para as imagens e dramas de um outro tempo histórico e social.
Abordo, de forma breve, dois livros que já este ano foram apresentados em Torres Novas, assinalando trabalhos que penso indesculpável deixar sem uma referência pública.
1. Começo pelo “COMUNISTAS, uma história do PCP em Torres Novas“, da autoria de João Carlos Lopes. O autor possui já uma bibliografia de publicações que é relevante. O livro que aqui nos importa reporta-se ao período desde a criação do PCP em 1921, com os primeiros e incipientes passos de torrejanos, até ao 25 de Abril de 1974 com outros comunistas e companheiros de resistência de áreas ideológicas diferentes. O vasto auditório presente na apresentação, na praça dos Claras, era bem o testemunho do quanto aquela obra tocava ainda as memórias de muitos dos assistentes. Apesar de ter por referência o caminho dos comunistas torrejanos durante a resistência antifascista, a diversidade democrática ali vista atesta com clareza a unidade de objectivos, a solidariedade e a cumplicidade que então tantos unia nessa luta comum pela liberdade. O autor leva a cabo uma investigação cuidadosa dos percursos do PCP e lutadores antifascistas em Torres Novas mas igualmente dos muitos, nem todos comunistas, que em tempos vários calcorrearam os duros trilhos da resistência e foram vítimas da repressão do regime. Das décadas mais recentes de antes de Abril de 1974, dado que alguns dos depoentes ainda por cá andam, foi possível relembrar alguns momentos de que foram parte activa. Esses depoimentos não são “interpretações” dos intervenientes, mas descrições factuais sujeitas a imprecisões, seja pelo tempo já transcorrido seja pelo carácter mais ou menos condicionado da vivência em semi-clandestinidade. Com este livro percorremos através das fotografias de pessoas e documentos alguns dos negros dias da vida de muitos cidadãos torrejanos, desvendando factos ignorados pela historiografia oficial. O autor, além da investigação que contextualiza os elementos históricos, locais e nacionais, recorre a inquéritos e depoimentos, escritos e orais, que clarificam igualmente a importância dos movimentos associativos e culturais que antecederam o 25 de Abril. Ficaria todavia incompleto o quadro, sem a referência, ainda que breve, aos que na imprensa local e no poder político ilegítimo foram colaborantes ideológicos e institucionais do ambiente obscurantista em que o país e Torres Novas viviam. Um livro determinante na compreensão do quadro social vivido durante décadas, essencialmente no mundo operário, mas de modo esclarecedor a resistência e os dias sombrios das famílias atingidas pelas carências materiais de um quotidiano incerto além das idas sofridas ao tribunal plenário da Boa-Hora ou aos fortes de Caxias e Peniche. 53 anos de resistência, dezenas de prisões e cerca de 100 anos de cadeia é o que estas páginas nos recordam. “COMUNISTAS, uma história do PCP em Torres Novas” é um livro escorreito, fruto de persistente e profícuo trabalho do João Carlos Lopes, nem apologético nem preconceituoso, numa linguagem o mais possível vinculada aos factos exaustivamente investigados.
2. Um outro livro apresentado na biblioteca de Torres Novas foi “TERRA VELHA” com autoria de José Manuel Bento Sampaio. O autor, sendo natural de Almeirim, mantém com a sociedade torrejana uma larga convivência, desde as actividades desenvolvidas pela oposição democrática antes do 25 de Abril até à prática profissional de médico-pediatra que culminaram como director do hospital local.
O livro “TERRA VELHA” tem por centro da narrativa a saga, real, vivida por centenas de rendeiros da zona de Almeirim em 1973, mas com antecedentes históricos mais profundos. O desenvolvimento literário apresenta-se em forma de peça ficcional teatralizada, o que desde logo confere um grau de complexidade na sua avaliação por quem, como é o caso do autor destas linhas, se situa nessa área mais com a sensibilidade de um espectador do que com a capacidade de avaliar os contextos da teatralidade. O autor dá-se ao detalhe, cuidadoso mas arrojado, de propor sugestões de encenação e enquadramentos cenográficos. A peça inicia-se em meados de Julho de 1973 na taberna/mercearia do Serapião, em Alterim, onde se encontram reunidos vários rendeiros para analisar o que fazer perante a pretensão dos proprietários das terras em aumentar as rendas para valores considerados incomportáveis. As ameaças de despejos são o horizonte próximo. Alguns já haviam desistido, outros viam o seu futuro próximo muito incerto. Pelas falas dos presentes, o autor faz-nos passear pelas memórias de outras lutas, desde as praças de jorna às conquistas das 8 horas de trabalho, desde o assassinato de Catarina Eufémia aos dramas da emigração, etc. Os rendeiros aguardam a chegada do jovem Alberto, estudante e jovem militante clandestino do PCP, que o livro não refere mas se subentende ser o próprio autor. Chegado este e discutido o problema é redigido, por Alberto, e assinado por mais de 100 rendeiros, um documento dirigido ao governo de Marcelo Caetano em que expõem o seu drama. Com “eleições” em Outubro, o tema fica a aguardar melhor ocasião. Em 25 de Abril de 1974 Portugal perspectiva caminhos de maior justiça e é a vez dos proprietários das terras ensejarem outras soluções, mais consentâneas com os novos ares. Desses tempos se dá conta o livro “TERRA VELHA”, seja através das reuniões expressas na ficção teatral seja no vasto acervo documental que completam a obra e dão suporte à sua contextualização nos tempos políticos de antes e após Abril. A oralidade e expressões dos personagens/rendeiros revelam a identificação do José Manuel Sampaio, com o ambiente em que decorre a acção, com traços de algum neorrealismo literário. Costuma dizer-se que uns fazem a história e outros escrevem-na, embora com isso estejam também a fazer a história do tempo em que a escrevem. Neste “TERRA VELHA” autor e participante nos acontecimentos cruzam-se.
Com especificidades diferentes, estes são livros essenciais que nos ajudam a revelar quem foi quem nos trilhos da resistência antifascista, transportando-nos para as imagens e dramas de um outro tempo histórico e social. Parabéns aos autores e boa leitura a quem quiser conhecer um pouco mais dos passados que se vão escoando das nossas memórias.
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![]() “Pobre é o discípulo que não excede o seu mestre” Leonardo da Vinci
Mais do que rumor, é já certo que a IA é capaz de usar linguagem ininteligível para os humanos com o objectivo de ser mais eficaz. |
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![]() "Hire a clown, get a circus" * Ele é antissistema. Prometeu limpar o aparelho político de toda a corrupção. Não tem filtros e, como o povo gosta, “chama os bois pelo nome”, não poupando pessoas ou entidades. |
![]() A eleição de um novo Papa é um acontecimento sempre marcante, apesar de se viver, na Europa, em sociedades cada vez mais estranhas ao cristianismo. Uma das grandes preocupações, antes, durante e após a eleição de Leão XIV, era se o sucessor de Francisco seria conservador ou progressista. |
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