A decapitação - jorge carreira maia
Opinião » 2020-10-23 » Jorge Carreira Maia"O facto de o professor decapitado o ter sido na sequência de uma aula onde se explicava a natureza da liberdade de expressão também é significativo"
O ataque terrorista perpetrado há dias em França por radicais islâmicos está sobrecarregado de simbolismo. Não se trata de um mero homicídio, como aqueles que resultam da deflagração de bombas, ataques com armas de fogo ou atropelamentos com viaturas. O facto do professor francês de História, Samuel Paty, ter sido decapitado é uma mensagem simbólica que deve ser lida numa multiplicidade de sentidos. Não é uma mera represália por um comportamento blasfemo para os crentes do Islão. Também o é. No entanto, seria de uma enorme ingenuidade lê-lo apenas dessa forma.
A prática da decapitação não terá sido no mundo islâmico – e, por certo, nos conflitos com crentes de outras religiões – um evento fortuito. O acto de decapitar um ocidental em pleno Ocidente tem uma mensagem dirigida para milhões de muçulmanos, um exemplo que se inscreve numa longa tradição, o qual deverá servir como uma motivação para o empoderamento das vanguardas fundamentalistas do Islão. Por outro lado, a decapitação também toca numa corda muito sensível dos franceses. Apesar do instrumento ser diferente, a decapitação foi o símbolo daquilo a que se chamou o Terror na Revolução Francesa.
O facto de o professor decapitado o ter sido na sequência de uma aula onde se explicava a natureza da liberdade de expressão também é significativo. A liberdade de expressão é um dos grandes valores do Ocidente, uma imagem de marca das suas sociedades. Em nenhum outro lado ela tem o peso que possui no mundo ocidental. Se países de outras culturas a abraçaram, isso deveu-se à influência vinda da Europa e da América. É, porém, um valor que atormenta todo o tipo de fundamentalista – religioso ou político – que não está disposto a respeitá-lo. Esta decapitação serve para dizer aos ocidentais que estão enganados, a sua liberdade de expressão é irrisória perante a lei e a vontade islâmicas.
A separação da cabeça do corpo tem ainda um outro valor simbólico, porventura o mais decisivo. Se a civilização ocidental se afirmou e tornou patente a falência da civilização muçulmana, isso deve-se ao conhecimento, ao projecto da ciência moderna e à valorização que se faz do uso da inteligência e da razão crítica. A mensagem é clara. Nem a inteligência nem a ciência chegarão para conter a ira dos fiéis do Islão. Facilmente se corta uma cabeça, e sem o corpo não há inteligência que assegure conhecimento ou superioridade civilizacional. Quem pensar que a decapitação do professor francês foi um acaso está muito enganado. Samuel Paty foi condenado à morte e a uma morte que significa muito mais do que a supressão de uma vida.
A decapitação - jorge carreira maia
Opinião » 2020-10-23 » Jorge Carreira MaiaO facto de o professor decapitado o ter sido na sequência de uma aula onde se explicava a natureza da liberdade de expressão também é significativo
O ataque terrorista perpetrado há dias em França por radicais islâmicos está sobrecarregado de simbolismo. Não se trata de um mero homicídio, como aqueles que resultam da deflagração de bombas, ataques com armas de fogo ou atropelamentos com viaturas. O facto do professor francês de História, Samuel Paty, ter sido decapitado é uma mensagem simbólica que deve ser lida numa multiplicidade de sentidos. Não é uma mera represália por um comportamento blasfemo para os crentes do Islão. Também o é. No entanto, seria de uma enorme ingenuidade lê-lo apenas dessa forma.
A prática da decapitação não terá sido no mundo islâmico – e, por certo, nos conflitos com crentes de outras religiões – um evento fortuito. O acto de decapitar um ocidental em pleno Ocidente tem uma mensagem dirigida para milhões de muçulmanos, um exemplo que se inscreve numa longa tradição, o qual deverá servir como uma motivação para o empoderamento das vanguardas fundamentalistas do Islão. Por outro lado, a decapitação também toca numa corda muito sensível dos franceses. Apesar do instrumento ser diferente, a decapitação foi o símbolo daquilo a que se chamou o Terror na Revolução Francesa.
O facto de o professor decapitado o ter sido na sequência de uma aula onde se explicava a natureza da liberdade de expressão também é significativo. A liberdade de expressão é um dos grandes valores do Ocidente, uma imagem de marca das suas sociedades. Em nenhum outro lado ela tem o peso que possui no mundo ocidental. Se países de outras culturas a abraçaram, isso deveu-se à influência vinda da Europa e da América. É, porém, um valor que atormenta todo o tipo de fundamentalista – religioso ou político – que não está disposto a respeitá-lo. Esta decapitação serve para dizer aos ocidentais que estão enganados, a sua liberdade de expressão é irrisória perante a lei e a vontade islâmicas.
A separação da cabeça do corpo tem ainda um outro valor simbólico, porventura o mais decisivo. Se a civilização ocidental se afirmou e tornou patente a falência da civilização muçulmana, isso deve-se ao conhecimento, ao projecto da ciência moderna e à valorização que se faz do uso da inteligência e da razão crítica. A mensagem é clara. Nem a inteligência nem a ciência chegarão para conter a ira dos fiéis do Islão. Facilmente se corta uma cabeça, e sem o corpo não há inteligência que assegure conhecimento ou superioridade civilizacional. Quem pensar que a decapitação do professor francês foi um acaso está muito enganado. Samuel Paty foi condenado à morte e a uma morte que significa muito mais do que a supressão de uma vida.
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Eleições "livres"... » 2024-03-18 » Hélder Dias |
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A carne e os ossos - pedro borges ferreira » 2024-03-08 » Pedro Ferreira Existe um paternalismo naqueles que desenvolvem uma compreensão do mundo extensiva que muitas vezes não lhes permite ver os outros, quiçá a si próprios, como realmente são. A opinião pública tem sido marcada por reflexões sobre a falta de memória histórica como justificação do novo mundo intolerante que está para vir, adivinho eu, devido à intenção de voto que se espera no CHEGA. |
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Este mundo e o outro - joão carlos lopes » 2024-02-22 Escreve Jorge Carreira Maia, nesta edição, ter a certeza de que este mundo já não é o seu e que o mundo a que chamou seu acabou. “Não sei bem qual foi a hora em que as coisas mudaram, em que a megera da História me deixou para trás”, vai ele dizendo na suas palavras sempre lúcidas e brilhantes, concluindo que “vivemos já num mundo tenebroso, onde os clowns ainda não estão no poder, mas este já espera por eles, para que a História satisfaça a sua insaciável sede de sangue e miséria”. |
2032: a redenção do Planeta - jorge cordeiro simões » 2024-02-22 » Jorge Cordeiro Simões
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» 2024-04-10
» Jorge Carreira Maia
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