Fundamentalismo eleitoral (III) - pedro ferreira
" “A vida é boa, e seria ainda melhor no futuro se o nosso paradigma não estivesse a mudar."
Nesta terceira e última parte, vou falar sobre assembleias de cidadãos no contexto do nosso concelho. Há que notar que estas não devem nunca ser vistas como um fim em si mesmas, mas antes como uma ferramenta que pode ajudar todo o tipo de colectivos a tomar decisões que através de outras estruturas não seriam tomadas.
E esta é uma premissa fundamental para se ser a favor ou contra mudar a forma como nos organizamos. Porque haveriam os torrejanos de querer mudar a organização das suas colectividades e da sua política? Por muito que algumas pessoas nos queiram fazer crer que a vida em Torres Novas é má, até porque o bem e o mal é sempre uma questão relativa a algo, a verdade é que viver em Torres Novas, em termos genéricos, é uma experiência muito boa. É óbvio que continua a haver casos pontuais de pessoas em pobreza extrema ou de exposição contínua à poluição, e que quero reforçar que acho que todos eles são inadmissíveis. Ainda assim, a vida da grande maioria dos torrejanos é agradável, e prova disso são as poucas ou nenhumas manifestações de descontentamento que têm sido feitas por parte da população nos últimos anos.
A vida é boa, e seria ainda melhor no futuro se o nosso paradigma não estivesse a mudar. Nós, que habitamos neste concelho, não precisamos que nos digam, de forma elaborada, através da televisão ou de outros meios de comunicação, que o clima está a mudar. É mais do que perceptível que os invernos já não são tão rigorosos, que há mais dias por ano em que as temperaturas ultrapassam os 40ºC e, sobretudo, que chove menos. Chove muito menos, e as previsões do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) são de que no futuro vai chover ainda menos. Mas a actividade humana não altera só o clima. A falta de biodiversidade e a agricultura intensiva também prejudicam a nossa capacidade de nos alimentarmos no futuro.
Ainda que esta seja uma informação dramática, é tudo menos nova. Bem antes de eu nascer, o assunto já era mais do que conhecido pela maioria da população e bem mais conhecido é agora. Porque será, então, que 30 anos depois das Nações Unidas chegarem ao consenso de que o planeta já tinha aquecido cerca de meio grau, de entretanto já ter aquecido outro meio grau, e com estas previsões da pluviosidade do IPMA não haver um único candidato às autárquicas que perceba que as eólicas não produzem água nem fazem chover? Ou que é irrelevante nós emitirmos menos CO2, enquanto a China e os Estados Unidos da América emitirem cada vez mais? Provavelmente, pelo mesmo motivo que andam de carrinha pelo concelho a berrar para o megafone “Votem no candidato X”: porque acham que somos estúpidos e que ordenar aos berros que votemos neles, é mais produtivo do que falar sobre o assunto e criar propostas para mitigar as consequências do mesmo.
É minha convicção, e de quase toda a comunidade científica (há negacionistas em todo o lado), de que este é o grande desafio das nossas vidas. O sistema eleitoral não foi capaz de falar no assunto, muito menos de criar propostas que nos salvassem. Resta ao povo pôr mãos à obra: criar assembleias de cidadãos.
Acredito também que a criação de uma assembleia de cidadãos beneficiaria todos os partidos e que sem eles é impossível implementar tal coisa na nossa autarquia. Vejo em muitos dos militantes que os compõe, pessoas que efectivamente querem o melhor para Torres Novas e os seus habitantes, e que meramente se esquecem que aqueles que estão no poder e a quem fazem oposição, quer interna quer externa, também um dia foram, e muito provavelmente ainda são, bem-intencionados como eles. E como bem-intencionados que são, certamente irão entregar na totalidade o poder ao povo, caso seja essa a deliberação do mesmo.
É aqui que o debate entre torrejanos deve começar: Partindo de tudo o que foi dito acima, que forma então deve ter a, ou, as assembleias de cidadãos do nosso concelho e que responsabilidades lhes devem ser confiadas?
Na minha opinião, devemos inicialmente e em conjunto com os partidos, criar uma assembleia de cidadãos, quantos mais membros melhor, escolhidos aleatoriamente e de forma ponderada pelo menos em relação ao sexo, idade e freguesia. De uma forma vaga, esta funcionaria da seguinte forma: haveria uma plataforma em que tanto os partidos como os habitantes poderiam sugerir propostas ou temas à assembleia, que depois votaria aqueles que achasse relevantes discutir. No fim de estabelecidos os assuntos a resolver, seria criado um grupo de trabalho para cada um, a quem iria competir reunir os partidos e especialistas para darem o seu aval sobre o tema. Após ouvi-los, a assembleia criaria novos grupos de trabalho para definirem propostas em concreto, para então ser votada a melhor, quiçá, com uma ou outra alteração menor. Seria expectável que a autarquia respeitasse estas decisões, ainda que não vinculativas.
Desta forma, mesmo que o partido no poder tivesse maioria absoluta, seria muito mais facilmente criticado se porventura escolhesse ignorar a assembleia e abraçar a tirania. Por outro, um partido no poder sem maioria poderia recorrer a este órgão para passar medidas importantes que a oposição, por motivos políticos, não quisesse votar. Já os temas que nenhum partido quisesse abordar poderiam chegar diretamente à assembleia, cujos membros, no caso de acharem ser relevante e pertinente, votariam a favor de a discutir.
O importante é que seria um processo claramente mais democrático, e, para quem se diz democrático, este tem de ser o caminho a seguir. Há também que suspeitar daqueles que sejam explicitamente contra estas assembleias que, quando bem feitas, são literalmente um referendo com a população bem informada.
Seria importante, também, que esta assembleia se tornasse um exemplo não só para outros concelhos, mas para as associações torrejanas. Há que trocar a vontade de competir pela de cooperar. Somos vizinhos e devemos não só agir como tal, mas criar também espaços que favoreçam esse tipo de relação. Se não conseguirmos gerir uma associação filarmónica como um colectivo, também não vamos ser capazes de gerir os nossos recursos hídricos de forma justa. As nossas associações devem abrir portas a modelos de gestão mais horizontais, sem listas nem eleições, mas sobretudo sem presidentes. Liderar tem de deixar de ser angariar votos através do culto da sua pessoa para passar a ser abdicar continuamente de protagonismos a favor da vontade da comunidade.
Relembro que esta é uma mudança obrigatória para todos aqueles que daqui a 30 anos querem continuar a ter uma boa vida em Torres Novas. Se não formos nós, agora, conscientes e informados, a decidir, será um dia a fome e a sede a ditar os termos da mudança.
O Futuro é agora.
Fundamentalismo eleitoral (III) - pedro ferreira
“A vida é boa, e seria ainda melhor no futuro se o nosso paradigma não estivesse a mudar.
Nesta terceira e última parte, vou falar sobre assembleias de cidadãos no contexto do nosso concelho. Há que notar que estas não devem nunca ser vistas como um fim em si mesmas, mas antes como uma ferramenta que pode ajudar todo o tipo de colectivos a tomar decisões que através de outras estruturas não seriam tomadas.
E esta é uma premissa fundamental para se ser a favor ou contra mudar a forma como nos organizamos. Porque haveriam os torrejanos de querer mudar a organização das suas colectividades e da sua política? Por muito que algumas pessoas nos queiram fazer crer que a vida em Torres Novas é má, até porque o bem e o mal é sempre uma questão relativa a algo, a verdade é que viver em Torres Novas, em termos genéricos, é uma experiência muito boa. É óbvio que continua a haver casos pontuais de pessoas em pobreza extrema ou de exposição contínua à poluição, e que quero reforçar que acho que todos eles são inadmissíveis. Ainda assim, a vida da grande maioria dos torrejanos é agradável, e prova disso são as poucas ou nenhumas manifestações de descontentamento que têm sido feitas por parte da população nos últimos anos.
A vida é boa, e seria ainda melhor no futuro se o nosso paradigma não estivesse a mudar. Nós, que habitamos neste concelho, não precisamos que nos digam, de forma elaborada, através da televisão ou de outros meios de comunicação, que o clima está a mudar. É mais do que perceptível que os invernos já não são tão rigorosos, que há mais dias por ano em que as temperaturas ultrapassam os 40ºC e, sobretudo, que chove menos. Chove muito menos, e as previsões do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) são de que no futuro vai chover ainda menos. Mas a actividade humana não altera só o clima. A falta de biodiversidade e a agricultura intensiva também prejudicam a nossa capacidade de nos alimentarmos no futuro.
Ainda que esta seja uma informação dramática, é tudo menos nova. Bem antes de eu nascer, o assunto já era mais do que conhecido pela maioria da população e bem mais conhecido é agora. Porque será, então, que 30 anos depois das Nações Unidas chegarem ao consenso de que o planeta já tinha aquecido cerca de meio grau, de entretanto já ter aquecido outro meio grau, e com estas previsões da pluviosidade do IPMA não haver um único candidato às autárquicas que perceba que as eólicas não produzem água nem fazem chover? Ou que é irrelevante nós emitirmos menos CO2, enquanto a China e os Estados Unidos da América emitirem cada vez mais? Provavelmente, pelo mesmo motivo que andam de carrinha pelo concelho a berrar para o megafone “Votem no candidato X”: porque acham que somos estúpidos e que ordenar aos berros que votemos neles, é mais produtivo do que falar sobre o assunto e criar propostas para mitigar as consequências do mesmo.
É minha convicção, e de quase toda a comunidade científica (há negacionistas em todo o lado), de que este é o grande desafio das nossas vidas. O sistema eleitoral não foi capaz de falar no assunto, muito menos de criar propostas que nos salvassem. Resta ao povo pôr mãos à obra: criar assembleias de cidadãos.
Acredito também que a criação de uma assembleia de cidadãos beneficiaria todos os partidos e que sem eles é impossível implementar tal coisa na nossa autarquia. Vejo em muitos dos militantes que os compõe, pessoas que efectivamente querem o melhor para Torres Novas e os seus habitantes, e que meramente se esquecem que aqueles que estão no poder e a quem fazem oposição, quer interna quer externa, também um dia foram, e muito provavelmente ainda são, bem-intencionados como eles. E como bem-intencionados que são, certamente irão entregar na totalidade o poder ao povo, caso seja essa a deliberação do mesmo.
É aqui que o debate entre torrejanos deve começar: Partindo de tudo o que foi dito acima, que forma então deve ter a, ou, as assembleias de cidadãos do nosso concelho e que responsabilidades lhes devem ser confiadas?
Na minha opinião, devemos inicialmente e em conjunto com os partidos, criar uma assembleia de cidadãos, quantos mais membros melhor, escolhidos aleatoriamente e de forma ponderada pelo menos em relação ao sexo, idade e freguesia. De uma forma vaga, esta funcionaria da seguinte forma: haveria uma plataforma em que tanto os partidos como os habitantes poderiam sugerir propostas ou temas à assembleia, que depois votaria aqueles que achasse relevantes discutir. No fim de estabelecidos os assuntos a resolver, seria criado um grupo de trabalho para cada um, a quem iria competir reunir os partidos e especialistas para darem o seu aval sobre o tema. Após ouvi-los, a assembleia criaria novos grupos de trabalho para definirem propostas em concreto, para então ser votada a melhor, quiçá, com uma ou outra alteração menor. Seria expectável que a autarquia respeitasse estas decisões, ainda que não vinculativas.
Desta forma, mesmo que o partido no poder tivesse maioria absoluta, seria muito mais facilmente criticado se porventura escolhesse ignorar a assembleia e abraçar a tirania. Por outro, um partido no poder sem maioria poderia recorrer a este órgão para passar medidas importantes que a oposição, por motivos políticos, não quisesse votar. Já os temas que nenhum partido quisesse abordar poderiam chegar diretamente à assembleia, cujos membros, no caso de acharem ser relevante e pertinente, votariam a favor de a discutir.
O importante é que seria um processo claramente mais democrático, e, para quem se diz democrático, este tem de ser o caminho a seguir. Há também que suspeitar daqueles que sejam explicitamente contra estas assembleias que, quando bem feitas, são literalmente um referendo com a população bem informada.
Seria importante, também, que esta assembleia se tornasse um exemplo não só para outros concelhos, mas para as associações torrejanas. Há que trocar a vontade de competir pela de cooperar. Somos vizinhos e devemos não só agir como tal, mas criar também espaços que favoreçam esse tipo de relação. Se não conseguirmos gerir uma associação filarmónica como um colectivo, também não vamos ser capazes de gerir os nossos recursos hídricos de forma justa. As nossas associações devem abrir portas a modelos de gestão mais horizontais, sem listas nem eleições, mas sobretudo sem presidentes. Liderar tem de deixar de ser angariar votos através do culto da sua pessoa para passar a ser abdicar continuamente de protagonismos a favor da vontade da comunidade.
Relembro que esta é uma mudança obrigatória para todos aqueles que daqui a 30 anos querem continuar a ter uma boa vida em Torres Novas. Se não formos nós, agora, conscientes e informados, a decidir, será um dia a fome e a sede a ditar os termos da mudança.
O Futuro é agora.
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![]() “Pobre é o discípulo que não excede o seu mestre” Leonardo da Vinci
Mais do que rumor, é já certo que a IA é capaz de usar linguagem ininteligível para os humanos com o objectivo de ser mais eficaz. |
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![]() Imagino que as últimas eleições terão sido oportunidade para belos e significativos encontros. Não é difícil pensar, sem ficar fora da verdade, que, em muitas empresas, patrões e empregados terão ambos votado no Chega. |
![]() "Hire a clown, get a circus" * Ele é antissistema. Prometeu limpar o aparelho político de toda a corrupção. Não tem filtros e, como o povo gosta, “chama os bois pelo nome”, não poupando pessoas ou entidades. |
![]() A eleição de um novo Papa é um acontecimento sempre marcante, apesar de se viver, na Europa, em sociedades cada vez mais estranhas ao cristianismo. Uma das grandes preocupações, antes, durante e após a eleição de Leão XIV, era se o sucessor de Francisco seria conservador ou progressista. |
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