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Quarenta vezes LIBERDADE!

Sociedade  »  2014-04-24 

Há 40 anos, Torres Novas tinha sensivelmente a mesma gente que tem hoje, mas repartida de forma diferente pelo espaço concelhio. Enquanto a população urbana representava cerca de 25% do total dos habitantes do concelho, hoje vivem nas freguesias com sede na cidade mais de metade dos torrejanos e, considerando também as freguesias urbanas de Riachos e Meia Via, a população nas freguesias rurais pouco ultrapassa os 30% do total.

A cidade e o concelho estavam mais distantes do resto do país. Não havia A1 nem A23 ao pé da porta e demorava-se mais de três horas de autocarro para chegar a Lisboa, um pouco mais de duas se fosse num serviço expresso, que passava por todas as vilas e aldeias até entrar finalmente na ”auto-estrada do Norte”, que morria ainda às portas da capital. Em muitas aldeias do concelho não havia luz eléctrica, quase nenhuma tinha esgotos ou água canalizada. As ruas não tinham asfalto e as estradas de ligação à sede do concelho eram estreitas e rudimentares. Os telefones eram raros, às vezes um único em toda uma aldeia. Às vezes nenhum.

Os torrejanos eram muitos diferentes. Havia no concelho 10 000 jovens até aos 15 anos de idade, hoje não ultrapassam os 5 milhares. Aos 4000 ”velhos” de ontem contrapõem-se os 9000 ”idosos” de hoje. Há mais saúde e segurança e por isso vive-se mais. Mas dantes viam-se muitas mulheres grávidas e agora são raras. Não havia serviço nacional de saúde e cuidados de saúde para a generalidade da populaçã apenas um hospital e uma casa de saúde privada. Hoje existe mais de uma dezena de centros de saúde espalhados pelo concelho, para além das clínicas e laboratórios e múltiplos estabelecimentos de apoio à saúde e ao bem-estar.

Trabalhava-se de forma diferente. Só 3500 mulheres tinham um ”emprego”, enquanto os homens empregados eram 12 000. Hoje, apenas meio milhar de vínculos laborais separa uns e outros. Havia ainda cerca de 3 mil pessoas a viver da agricultura, hoje são pouco mais de duas centenas. Nas fábricas e oficinas, laboravam mais de 6 mil operários, hoje reduzidos a 4000 ou nem tanto. Mas os serviços empregam hoje mais de 10 000 pessoas, o dobro de há 40 anos. Havia três bancos e Caixa Agrícola, hoje estão instalados mais de uma dezena de instituições bancárias. Não havia um único ”supermercado” como os de hoje. Vivia-se com pouco dinheiro e os ordenados eram em geral muito baixos.

Estamos mais instruídos. Aos 5% da população com o ensino secundário completo, opõem-se os cerca de 20% com esse grau de ensino. Menos de 1% dos torrejanos tinha um curso superior: essa média foi multiplicada por 12. A rede de creches e jardins-de-infância abrange quase toda a população infantil, quando há 40 anos era residual. Há 40 anos, o ensino liceal, que só tinha uma secção há um ano e pouco, era destinado a um estrato muito limitado de jovens, que entravam por essa via nos colégios de Andrade Corvo ou de Santa Maria, ou rumavam a Tomar ou Santarém. Contudo, o ensino técnico estava em expansão e a escola industrial, onde havia uma rede a separar rapazes raparigas, e o ciclo, acolhiam já milhares de estudantes. Aprendia-se ali a electricista ou serralheiro, havia os cursos de comércio e de formação feminina. Hoje temos escolas secundárias e centros escolares e o ensino é a actividade que mais movimenta a nossa terra. Nos dias em que não há escola, o tempo parece parado e abate-se sobre a cidade uma estranha melancolia.

A vida era diferente. Chegava-se à vila à segunda-feira e encontravam-se milhares de pessoas espalhadas pelo mercado no Nogueiral, e pelo largo do Paço, na praça do peixe, no largo do Matadouro ou no Quinchoso, em todo o lado onde se pudesse alinhavar um negócio ou um contrato. Dezenas de camionetas dos Claras acotovelavam-se para sair e entrar na pequena garagem apinhada de gente e furavam pelas exíguas ruas da vila, disputando-as com algumas carroças e já raros burros. E por muita e muita gente. Que acorria às dezenas de lojas de mercearia a retalho. Aos armazéns de produtos para a agricultura e para o gado. Às drogarias e lojas de ferragens. Havia lojas de correeiro, de alfaiates e modistas, latoeiros, marceneiros e sapateiros, vendia-se ferro e cabedais. Paredes meias com os bairros e dentro deles, fumegavam padarias e pequenas fundições. Tínhamos ao pé da porta serralharias e carpintarias, caldeirarias, mecânicos, oficinas de rádios e electrodoméstico. O cheiro a café torrado invadia ruas do centro, sentia-se o cheiro intenso das lojas de bacalhau e de enchidos. Casas de pasto ofereciam peixe assado nas ruas, prometiam o bom vinho da Mata ou de Alcorochel.

E havia as grandes fábricas e oficinas: o Nery e a Fiação, com centenas de operários, as oficinas dos Claras, os correios e o pessoal dos telefones, centenas também, os grandes escritórios, o Félix Carreira, a fundição Réquio e o Abílio Pereira Reis, os Lourenços, a destilaria, as gráficas, e antes da sirene da uma hora da tarde as ruas e passeios estavam apinhados de operários a espreitar o sol e o bulício de uma terra a explodir de vida.

Também havia muitos militares nas ruas da vila, animando tascas e esplanadas, ajudando a encher as bancadas do estádio ou a plateia do Virgínia, que dava cinema quase todos os dias e sessões triplas ao sábado e domingo, e a tropa tornava-se mais presente ainda sempre que algum acontecimento público ou oficial exigia ”ordem” acrescida. Todos os anos partia um ”contingente” destes jovens rumo às guerras da Guiné ou de Moçambique e a vila parecia mais triste. Os rapazes viviam aterrados de medo pela ideia de morrerem numa guerra. Ia-se ali à tabacaria, às cinco da tarde, esperar pelo ”Diário de Lisboa” ou pelo ”Popular”.

Não se falava de política e não se tinham conversas alto. Mas havia quem escrevesse frases nas paredes e distribuísse papéis a falar de mudança [Há ainda um muro da cidade com as marcas de se ter apagado uma frase contra a guerra, escrita poucos dias antes do dia que se sabe. Deve ser caso único no país, está ali faz agora 40 anos]. Não se ouviam os discos que se queria nem os livros todos que havia, mas o Cine-clube ia mostrando uns filmes com entrelinhas e conspirava-se no café Portugal atrás do dominó. Havia muitos bailes e o conjunto Níger, malta nova com o cabelo grande e sapatos de tacão alto. E calças à boca de sino. E já se notava que as igrejas estavam a esvaziar-se.

Havia ainda, também, economia rural. Os trabalhos da agricultura e os pequenos serviços subsidiários de uma população que, em maioria, habitava em mais de cem lugares e aldeias. Onde ainda laboravam sapateiros e barbeiros, madrugavam as tabernas para o mata-bico de pedreiros, pastores e padeiros, abundavam vacarias que forneciam o leite, pequenos talhos e armazéns, lojas onde se vendia azeite, vinho ou figo a granel, negociantes de frutas ou batatas. De todo esse cenário rural ficaram apenas as escolas, por mais uns anos, os que bastaram para ensinar os caminhos do mundo a toda agente de todas aldeias. Que hoje não passam de dormitórios onde não se vê vivalma durante o dia, velhos arrecadados em casa ou em lares e centro de dia, as únicas actividades económicas das aldeias, para além do pequeno café e da mercearia a ameaçar fecho.

Somos diferentes, portanto. Podemos andar em grupo, toda a noite, em qualquer lado, quando há 40 anos não podíamos ser mais de dois que vinha logo a polícia mandar dispersar. É preciso dizê-l havia dois ou três pessoas que mandavam nisto tudo. Só havia um jornal local. Agora, elegemos os nossos representantes e todos os que, de alguma forma, são responsáveis pelo destino da nossa comunidade, e às vezes temos a sensação de que há quem mande em tudo e achamos que é uma perversão da democracia.

Afastámo-nos da terra, das paisagens e das profissões dos nossos avós e falamos da serra e do rio numa perspectiva poética, e chamamos património a tudo o que, do passado, construiu a nossa identidade. Dizemos nós. Mas a nossa identidade, a mais forte, é a da nossa vida, a que vamos deixar para quem vier e olhar para o que fizémos. A nossa identidade, a do tempo presente, é a dos centros comerciais ali ao lado, das grandes superfícies que nunca dormem e nos aturam os caprichos, da internet e do mundo todo na mão, das músicas que ouvimos e da roupa que vestimos, das viagens e dos regressos. Mudámos de casa, criámos centros à volta da cidade e autênticas villas de um fausto romano um pouco por todo o concelho onde vivem, muitas vezes, duas pessoas em cada mansão.

Andamos pelas ruas desertas da antiga vila, só animadas no verão, e somos assaltados pela nostalgia de um passado que imaginamos, porque o que imaginamos tem traços mais fortes do que a realidade que aconteceu. E somos também assaltados pela nostalgia de um futuro diferente para a nossa terra e para a nossa vida, porque imaginamos que temos mão no futuro. É esse o doce alimento que a liberdade nos dá.

20 de Abril de 2014

 

 

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