O discurso do rancor
Opinião » 2020-01-10 » Jorge Carreira Maia"No entanto, a banalização do discurso do ódio e do rancor social está a criar o clima que legitimará a acção violenta e, acima de tudo, a rejeição das instituições da democracia liberal."
Vivemos num país cordato e seguro, onde a violência é diminuta e o respeito pelos outros é significativo. Somos, ao mesmo tempo, medianamente ricos e medianamente pobres e, ao longo destes anos de democracia, temos sabido resolver os problemas com que nos deparámos. A nossa economia não é das mais brilhantes, mas também não é das piores. Não existem problemas com a presença de grandes comunidades estranhas à nossa cultura de base nem, tão pouco, nenhum perigo perceptível ameaça a independência e a liberdade da nação. Todos estes dados seriam suficientes para que nos fosse completamente estranho o discurso de rancor que existe nas redes sociais, que se propaga a grande velocidade, fazendo multiplicar as metástases da doença por todo o corpo social.
Esse rancor encontrou agora uma voz na Assembleia da República, voz que ameaça multiplicar-se. Pessoas que até aqui tinham mostrado posições políticas cordatas e razoáveis, onde imperava a tolerância com a diferença, estão a radicalizar-se, fazendo coro com os exploradores do ressentimento. Neste momento, a radicalização e o rancor vêm claramente da direita. Noutros tempos vieram da esquerda, embora nunca tivessem encontrado, nessa altura, a complacência social que existe neste momento para este tipo de discurso de ódio. Frequentar as redes sociais é uma lição sobre a erosão que a ideia de tolerância está a sofrer no nosso país. Esta radicalização social à direita – não nos partidos tradicionais da direita democrática, embora estes estejam já ameaçados por este clima – irá gerar, mais tarde ou mais cedo, idêntica radicalização social à esquerda.
Uma parte do país, ainda pequena mas em crescimento, parece apostada em criar um clima de ódio tal que poderá vir a pôr em perigo as instituições democráticas. O desejo de aniquilar o outro não é uma coisa que se diga apenas em surdina num grupo de amigos. Esse desejo é expresso todos os dias nas redes sociais, onde se multiplica como as células cancerosas no corpo de um paciente. Sabemos que entre fazer um comentário no facebook e passar à acção vai uma longa distância. No entanto, a banalização do discurso do ódio e do rancor social está a criar o clima que legitimará a acção violenta e, acima de tudo, a rejeição das instituições da democracia liberal. Muitas destas pessoas pretendem, a partir do discurso do rancor, abrir o caminho para tempos de cólera. Há gente que sonha com a violência como medida purificadora sabe-se lá de que pecados. Veremos se os nossos brandos costumes são suficientes para travar a raiva que parece haver por aí.
O discurso do rancor
Opinião » 2020-01-10 » Jorge Carreira MaiaNo entanto, a banalização do discurso do ódio e do rancor social está a criar o clima que legitimará a acção violenta e, acima de tudo, a rejeição das instituições da democracia liberal.
Vivemos num país cordato e seguro, onde a violência é diminuta e o respeito pelos outros é significativo. Somos, ao mesmo tempo, medianamente ricos e medianamente pobres e, ao longo destes anos de democracia, temos sabido resolver os problemas com que nos deparámos. A nossa economia não é das mais brilhantes, mas também não é das piores. Não existem problemas com a presença de grandes comunidades estranhas à nossa cultura de base nem, tão pouco, nenhum perigo perceptível ameaça a independência e a liberdade da nação. Todos estes dados seriam suficientes para que nos fosse completamente estranho o discurso de rancor que existe nas redes sociais, que se propaga a grande velocidade, fazendo multiplicar as metástases da doença por todo o corpo social.
Esse rancor encontrou agora uma voz na Assembleia da República, voz que ameaça multiplicar-se. Pessoas que até aqui tinham mostrado posições políticas cordatas e razoáveis, onde imperava a tolerância com a diferença, estão a radicalizar-se, fazendo coro com os exploradores do ressentimento. Neste momento, a radicalização e o rancor vêm claramente da direita. Noutros tempos vieram da esquerda, embora nunca tivessem encontrado, nessa altura, a complacência social que existe neste momento para este tipo de discurso de ódio. Frequentar as redes sociais é uma lição sobre a erosão que a ideia de tolerância está a sofrer no nosso país. Esta radicalização social à direita – não nos partidos tradicionais da direita democrática, embora estes estejam já ameaçados por este clima – irá gerar, mais tarde ou mais cedo, idêntica radicalização social à esquerda.
Uma parte do país, ainda pequena mas em crescimento, parece apostada em criar um clima de ódio tal que poderá vir a pôr em perigo as instituições democráticas. O desejo de aniquilar o outro não é uma coisa que se diga apenas em surdina num grupo de amigos. Esse desejo é expresso todos os dias nas redes sociais, onde se multiplica como as células cancerosas no corpo de um paciente. Sabemos que entre fazer um comentário no facebook e passar à acção vai uma longa distância. No entanto, a banalização do discurso do ódio e do rancor social está a criar o clima que legitimará a acção violenta e, acima de tudo, a rejeição das instituições da democracia liberal. Muitas destas pessoas pretendem, a partir do discurso do rancor, abrir o caminho para tempos de cólera. Há gente que sonha com a violência como medida purificadora sabe-se lá de que pecados. Veremos se os nossos brandos costumes são suficientes para travar a raiva que parece haver por aí.
As eleições e o triunfo do pensamento mágico - jorge carreira maia » 2024-04-10 » Jorge Carreira Maia Existe, em Portugal, uma franja pequena do eleitorado que quer, deliberadamente, destruir a democracia, não suporta os regimes liberais, sonha com o retorno ao autoritarismo. Ao votar Chega, fá-lo racionalmente. Contudo, a explosão do eleitorado do partido de André Ventura não se explica por esse tipo de eleitores. |
Eleições "livres"... » 2024-03-18 » Hélder Dias |
Este é o meu único mundo! - antónio mário santos » 2024-03-08 » António Mário Santos Comentava João Carlos Lopes , no último Jornal Torrejano, de 16 de Fevereiro, sob o título Este Mundo e o Outro, partindo, quer do pessimismo nostálgico do Jorge Carreira Maia (Este não é o meu mundo), quer da importância da memória, em Maria Augusta Torcato, para resistir «à névoa que provoca o esquecimento e cegueira», quer «na militância política e cívica sempre empenhada», da minha autoria, num país do salve-se quem puder e do deixa andar, sempre à espera dum messias que resolva, por qualquer gesto milagreiro, a sua raiva abafada de nunca ser outra coisa que a imagem crónica de pobreza. |
Plantação intensiva: do corte à escovinha e tudo em fila aos horizontes metalificados - maria augusta torcato » 2024-03-08 » Maria Augusta Torcato Não sei se por causa das minhas origens ou simplesmente da minha natureza, há em mim algo, muito forte, que me liga a árvores, a plantas, a flores, a animais, a espaços verdes ou amarelos e amplos ou exíguos, a serras mais ou menos elevadas, de onde as neblinas se descolam e evolam pelos céus, a pedras, pequenas ou pedregulhos, espalhadas ou juntinhas e a regatos e fontes que jorram espontaneamente. |
A crise das democracias liberais - jorge carreira maia » 2024-03-08 » Jorge Carreira Maia A crise das democracias liberais, que tanto e a tantos atormenta, pode residir num conflito entre a natureza humana e o regime democrático-liberal. Num livro de 2008, Democratic Authority – a philosophical framework, o filósofo David. |
A carne e os ossos - pedro borges ferreira » 2024-03-08 » Pedro Ferreira Existe um paternalismo naqueles que desenvolvem uma compreensão do mundo extensiva que muitas vezes não lhes permite ver os outros, quiçá a si próprios, como realmente são. A opinião pública tem sido marcada por reflexões sobre a falta de memória histórica como justificação do novo mundo intolerante que está para vir, adivinho eu, devido à intenção de voto que se espera no CHEGA. |
O Flautista de Hamelin... » 2024-02-28 » Hélder Dias |
Este mundo e o outro - joão carlos lopes » 2024-02-22 Escreve Jorge Carreira Maia, nesta edição, ter a certeza de que este mundo já não é o seu e que o mundo a que chamou seu acabou. “Não sei bem qual foi a hora em que as coisas mudaram, em que a megera da História me deixou para trás”, vai ele dizendo na suas palavras sempre lúcidas e brilhantes, concluindo que “vivemos já num mundo tenebroso, onde os clowns ainda não estão no poder, mas este já espera por eles, para que a História satisfaça a sua insaciável sede de sangue e miséria”. |
2032: a redenção do Planeta - jorge cordeiro simões » 2024-02-22 » Jorge Cordeiro Simões
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Avivar a memória - antónio gomes » 2024-02-22 » António Gomes Há dias atrás, no âmbito da pré-campanha eleitoral, visitei o lugar onde passei a maior parte da minha vida (47 anos), as oficinas da CP no Entroncamento. Não que tivesse saudades, mas o espaço, o cheiro e acima de tudo a oportunidade de rever alguns companheiros que ainda por lá se encontram, que ainda lá continuam a vender a sua força de trabalho, foi uma boa recompensa. |
» 2024-04-10
» Jorge Carreira Maia
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