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Grandes medos, grandes esperanças: entendimento e confiança.

Opinião  »  2020-04-15  »  Margarida Trindade

"Procuro nos livros compreensão. Vejo nos livros a manifestação inequívoca da sobrevivência."

A História, hoje mais do que nunca, lembra-nos da peste negra, da lepra, da tosse convulsa, da tuberculose, da varíola, do sarampo, da gripe, de doenças e pragas cujo medo levou ao enclausuramento das cidades, à marginalização social, ao desprezo pelo doente, ao recurso a crendices populares quantas vezes fatais para o enfermo. Fora de qualquer compreensão à época, escapavam ao controlo das pessoas, dizimavam populações, condicionavam comportamentos e transformavam inevitavelmente mentalidades.

Noutros tempos em que as infeções quotidianas, a falta de higiene, de água, de saneamento, e a sobrelotação de territórios, públicos e domésticos, ditavam a morte precoce, o medo impunha as regras. Cego a afectos ou a qualquer condição social, vingava o mais forte que se safasse ou sobrevivesse ao contágio. O medo, a ignorância e a miséria eram (como hoje) terrenos férteis para crescerem saques, disputas, guerras e fanatismos. E eram o futuro certeiro e devastador.

Por outro lado, resistiam nestes contextos de desespero e agruras alguns oásis como confrarias e irmandades, muitas ainda assim de pendor laico, como lugares de solidariedade e de entre-ajuda. Lugares onde cabia uma certa esperança. Pensar nisto e arrumar ideias, ajuda-me a perspetivar uma miragem de futuro, que me é essencial, ainda que bastante difusa.

Fui à estante buscar três livros que trago comigo há décadas* e andei pela Europa dos séculos XIII ao século XIX, aos sustos da varíola, à cólera, às vagas de peste, ao terror perante uma pequena tosse de um filho ou vizinho, aos guetos da lepra. Nas cidades, nas casas ricas, nas cortes, nos bairros pobres, nas ruas. Nos navios. Nas quarentenas ao largo antes de qualquer desembarque, depois de meses em alto mar. Nas rotas comerciais com a Ásia, às populações também dizimadas do lado de lá do Atlântico por falta de anticorpos que as defendessem das doenças introduzidas nas comunidades por portugueses e espanhóis.

Procuro nos livros compreensão. Vejo nos livros a manifestação inequívoca da sobrevivência. São a evidência disso: nós somos os bisnetos, netos e filhos dos sobreviventes. E se temos nos livros âncoras, como prova dessa vitória, por outro lado é neles que se espelham anónimas e múltiplas derrotas.

Mas é a partir do erro que o mundo avança. Aprender a encarar o erro e vencê-lo é avançar e progredir. E quantas vezes o erro não é senão a escuridão, a ignorância a que o medo nos submete?

O saber, o conhecimento, a informação e o esclarecimento são os maiores inimigos do medo. Afinal, os melhores aliados da esperança, os alicerces do futuro e podem estar mesmo aqui à mão, num livro aberto perto de nós.
E, ainda que hoje a utopia seja a irmandade, que esta seja sempre um farol. E mesmo que essa luz seja só um lugar-comum para um abraço possível, a gente vai continuar.

* DUBY, Georges, A EUROPA NA IDADE MÉDIA, Teorema, Lisboa, 1989.
LE GOFF, Jacques, A CIVILIZAÇÃO DO OCIDENTE MEDIEVAL, vol. I, Editorial Estampa, Lisboa, 1983 e AS DOENÇAS TÊM HISTÓRIA, Terramar, Lisboa, 1991.

 

 

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