Violetta ou amores-perfeitos
Opinião » 2015-01-30 » Adelino Pires
Esta coisa das corrupções, fuga de informações, milhares de milhões e outras tantas confusões, deixam-nos a cabeça em água e ficamos assim como com as ideias a boiar.
Eis senão quando as Tvs dão uma noticiazita diferente. Vá lá, desta vez falam-nos de flores. Não de cravos que ainda não é o tempo, não de rosas que são mais os espinhos, nem tão pouco de camélias que, por aqui, pouco se dão.
Naquele dia, nas Tvs a flor eleita foi a violeta. Não que fosse das minhas preferidas. Sempre gostei mais das de geração espontânea ou mesmo de amores-perfeitos, a flor das flores para o meu pai. Mas, mesmo assim, do mal o menos. Farto das notícias do costume, lá me convenci a aprender um pouco mais sobre as violetas, a sua origem, o seu perfume, as suas matizes, a sua história.
Mal a reportagem começou, logo me apercebi, qual acordo ortográfico, que aquilo que imaginara não era bem o que as imagens traduziam. A violeta passara a Violetta e desde logo fiquei esclarecid originária da argentina, seria uma flor recente, com dezoito aninhos apenas, mas já com milhões de sementes.
Cresce, cresce, sem que precise de água que a regue. Bastam uns minutinhos de prime-time nas Tvs dos países supostamente desenvolvidos e onde, pelos vistos, se confundem alfarrábios com alfarrobas.
E toda uma geração de meninas que podem não ler muito e estudar pouco, que podem até nem saber a diferença entre histeria e filosofia, sabem de cor a côr das botas, das malas e dos batons da flor Violetta. Lá isso sabem elas, sem recorrer a manuais escolares.
E os papás, que acham que um livrito a meia dúzia de euros é carote e ocupa o espaço de um bibelot, que um bilhetinho para o cinema ou para o teatro é um luxo que vai para o lixo, que uma ida a um museu é uma chatice só para ver múmias e coisas assim, os papás dizia eu, lá foram amealhando, ao longo de meses, várias dezenas ou centenas de euros para dar a prendinha que a filhota merecia, que por elas fazem tudo. É sempre tempo de comprar as pazes da adolescência em pacotes de felicidade.
E se no jardim do palco a Violetta pulará de contente por ver tanta sementinha de euro a regar-lhe a raiz, no palco da vida as violettinhas continuarão a acotovelar-se para a cheirar, beijar, desfolhar e sentir e, quem sabe, um dia, poderem também crescer sem necessidade de água ou do adubo de arte e cultura.
E assim continuaremos a cultivar os nossos jardins. Com Violettas e não violetas. Com jacarandás que já cá andaram e já se piraram. Com os papás a amealhar para a próxima flor que vier ao meo jardim.
Eu cá continuarei a recusar as mutações genéticas. Preferirei sempre as flores silvestres, com mais ou menos espinhos. E, naturalmente, os jardins de amores-perfeitos, quase perfeitos ou mesmo imperfeitos.
Violetta ou amores-perfeitos
Opinião » 2015-01-30 » Adelino PiresEsta coisa das corrupções, fuga de informações, milhares de milhões e outras tantas confusões, deixam-nos a cabeça em água e ficamos assim como com as ideias a boiar.
Eis senão quando as Tvs dão uma noticiazita diferente. Vá lá, desta vez falam-nos de flores. Não de cravos que ainda não é o tempo, não de rosas que são mais os espinhos, nem tão pouco de camélias que, por aqui, pouco se dão.
Naquele dia, nas Tvs a flor eleita foi a violeta. Não que fosse das minhas preferidas. Sempre gostei mais das de geração espontânea ou mesmo de amores-perfeitos, a flor das flores para o meu pai. Mas, mesmo assim, do mal o menos. Farto das notícias do costume, lá me convenci a aprender um pouco mais sobre as violetas, a sua origem, o seu perfume, as suas matizes, a sua história.
Mal a reportagem começou, logo me apercebi, qual acordo ortográfico, que aquilo que imaginara não era bem o que as imagens traduziam. A violeta passara a Violetta e desde logo fiquei esclarecid originária da argentina, seria uma flor recente, com dezoito aninhos apenas, mas já com milhões de sementes.
Cresce, cresce, sem que precise de água que a regue. Bastam uns minutinhos de prime-time nas Tvs dos países supostamente desenvolvidos e onde, pelos vistos, se confundem alfarrábios com alfarrobas.
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E os papás, que acham que um livrito a meia dúzia de euros é carote e ocupa o espaço de um bibelot, que um bilhetinho para o cinema ou para o teatro é um luxo que vai para o lixo, que uma ida a um museu é uma chatice só para ver múmias e coisas assim, os papás dizia eu, lá foram amealhando, ao longo de meses, várias dezenas ou centenas de euros para dar a prendinha que a filhota merecia, que por elas fazem tudo. É sempre tempo de comprar as pazes da adolescência em pacotes de felicidade.
E se no jardim do palco a Violetta pulará de contente por ver tanta sementinha de euro a regar-lhe a raiz, no palco da vida as violettinhas continuarão a acotovelar-se para a cheirar, beijar, desfolhar e sentir e, quem sabe, um dia, poderem também crescer sem necessidade de água ou do adubo de arte e cultura.
E assim continuaremos a cultivar os nossos jardins. Com Violettas e não violetas. Com jacarandás que já cá andaram e já se piraram. Com os papás a amealhar para a próxima flor que vier ao meo jardim.
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