• SOCIEDADE-  • CULTURA  • DESPORTO  • OPINIÃO
  Sexta, 19 Abril 2024    •      Directora: Inês Vidal; Director-adjunto: João Carlos Lopes    •      Estatuto Editorial    •      História do JT
   Pesquisar...
Seg.
 26° / 11°
Céu limpo
Dom.
 26° / 12°
Períodos nublados com chuva fraca
Sáb.
 24° / 13°
Céu nublado com aguaceiros e trovoadas
Torres Novas
Hoje  26° / 13°
Períodos nublados com chuva fraca
       #Alcanena    #Entroncamento    #Golega    #Barquinha    #Constancia 

Vencimento nostalgia

Opinião  »  2014-01-31  »  Miguel Sentieiro

Troquei de carro. Ou antes, fui obrigado a trocar de carro, uma vez que o meu veículo decidiu falecer à revelia do dono. Ainda tentei reanimá-lo, com umas festinhas no capô e uns pontapés nas jantes, mas ele claudicou. Mas não se limitou a claudicar de forma passiva; até chegarmos às festinhas no capô, já ele tinha feito grandes festinhas na carteira do dono, entre tubagens, embraiagens, motor de arranque, correia de distribuição. Mas os laços que nos uniam eram de tal maneira fortes, que ele decidiu que gostaria de levar o dono para a cova com ele. Percebe-se que nunca esqueceu os momentos fraternos que vivemos juntos, das peúgas suadas debaixo dos bancos, dos caminhos em terra batida que percorremos, dos iceteas espalmados no banco do passageiro, das cascas de banana em compostagem no guarda-luvas. Decidiu então falecer neste momento de prosperidade económica em que vivemos, para que o dono esbanjasse, também ele, a sua própria prosperidade. Em sua memória, fiz-lhe a vontade e adquiri um veículo afogado em tecnologia onde tudo apita e nos faz pensar que prevaricamos a toda a hora. Apita quando não se põe o cinto, apita quando se tira o cinto, apita quando as luzes estão ligadas, apita quando é preciso fazer a revisão, apita quando não pressionamos o travão de mão, apita quando saímos do carro em andamento…? (já um tipo não pode saltar do carro). Este árbitro de futebol de quatro rodas tem, contudo, uma apitadela que me faz babar de contentament o apito do sensor da marcha atrás. E não se limita a apitar quando estamos prestes a embater na oliveira lá de casa. Avisa com uma luz que vai passando de verde para vermelho à medida que o pára-choques se aproxima do estado de espalmamento, terminando com um enorme e reluzente STOP antes do impacto. Bem sei que nesta fase deveria estar a fazer o luto pelo meu falecido carro, mas estou naquela fase de afogamento tecnológico, qual criança inebriada com a playstation recebida no Natal, e sem qualquer sinal de nostalgia das avarias do meu chaço anterior.

Decidi, então, pegar no meu compacto amovível de tecnologia e ir até ao multibanco ver o recibo de vencimento. Olhei para o tal recibo e, depois de soltar um termo imperceptível, consegui sentir um misto de alegria e tristeza. Por um lado, ao fim de 25 anos a trabalhar, nunca o meu salário se aproximou tanto daquele que eu recebia no meu primeiro ano de vencimento. E essa sensação nostálgica transportou-me à minha primeira ferrugenta renault 4L, aos 0,6 cêntimos do litro de gasolina, aos 0,4 escudos do preço da bica, ao meu ano de jovem estagiário, que não pensava em custos do rolo de papel higiénico. Mas o recibo do meu ”vencimento nostalgia” deixou-me com alguma pena dos nossos decisores políticos por, no meio de tantos Mercedes e BMW onde sentam as majestosas bundas, ainda não terem adquirido um veículo daqueles à séria, com sensores de marcha atrás. A atestar pela velocidade de recuo a que sujeitam as economias familiares, que nos levam a sentir os costázios a furar sucessivos muros de betão, decerto que não têm o apito milagroso nem a luzinha vermelha a acender. Ei, meus senhores! Comprem lá o tal sensor, que a minha carroçaria de retaguarda não aguenta muito mais espalmamento! Quando pensava que não me ouviam, eis que surgem os primeiros sinais de se querer inverter a tendência de regressão económica. Uma medida de fundo, que revolucionará o panorama de desenvolvimento nacional concertad um referendo! Isso! Consulte-se o povo para que esta carroça ande para a frente! O tema do referendo?... É?... Vamos lá, deixem-se de suspense (decerto um dos grandes temas aglutinadores do desenvolvimento nacional e social como a privatização da energia, a regularização dos impostos, o funcionamento da justiça), a co-adopção por casais homossexuais! Muito bem! Finalmente alguém com clarividência para pôr isto a andar para a frente. Eu compreendo o pensamento do tipo que teve essa ”holofótica” ideia. ”Deixa cá ver: podíamos legislar directamente sobre a co-adopção por casais homossexuais, mas gastando 10 milhões de euros é outra coisa! Tem mais impacto, faz com que os cidadãos sintam essa medida como sua! ” De impacto a nossa carroçaria de retaguarda percebe, depois de vários estampanços contra oliveiras no caminho. Aguardo ansioso pela próxima ideia de referendo sobre a proibição de lançamento de cascas de amendoim pela janela do carro, ou sobre a limitação do consumo de bolacha Maria a partir das 23 h, ou a imprescidível abolição das brocas dos dentistas.

A avaliar pelo ritmo da marcha atrás ininterrupta que este veículo assumiu, rapidamente a magnitude do meu salário encontrar-se-á com a nostalgia da mesada que a minha mãe me dava nos tempos de adolescente. Mas, mas... já há malta de 40 anos que voltou a viver com a mesada das mães? Grandes malandros, vão comprar os livros do Tex e pacotes de batatas Pala-pala antes de eu lá chegar.

 

 

 Outras notícias - Opinião


As eleições e o triunfo do pensamento mágico - jorge carreira maia »  2024-04-10  »  Jorge Carreira Maia

Existe, em Portugal, uma franja pequena do eleitorado que quer, deliberadamente, destruir a democracia, não suporta os regimes liberais, sonha com o retorno ao autoritarismo. Ao votar Chega, fá-lo racionalmente. Contudo, a explosão do eleitorado do partido de André Ventura não se explica por esse tipo de eleitores.
(ler mais...)


Eleições "livres"... »  2024-03-18  »  Hélder Dias

Este é o meu único mundo! - antónio mário santos »  2024-03-08  »  António Mário Santos

Comentava João Carlos Lopes , no último Jornal Torrejano, de 16 de Fevereiro, sob o título Este Mundo e o Outro, partindo, quer do pessimismo nostálgico do Jorge Carreira Maia (Este não é o meu mundo), quer da importância da memória, em Maria Augusta Torcato, para resistir «à névoa que provoca o esquecimento e cegueira», quer «na militância política e cívica sempre empenhada», da minha autoria, num país do salve-se quem puder e do deixa andar, sempre à espera dum messias que resolva, por qualquer gesto milagreiro, a sua raiva abafada de nunca ser outra coisa que a imagem crónica de pobreza.
(ler mais...)


Plantação intensiva: do corte à escovinha e tudo em fila aos horizontes metalificados - maria augusta torcato »  2024-03-08  »  Maria Augusta Torcato

Não sei se por causa das minhas origens ou simplesmente da minha natureza, há em mim algo, muito forte, que me liga a árvores, a plantas, a flores, a animais, a espaços verdes ou amarelos e amplos ou exíguos, a serras mais ou menos elevadas, de onde as neblinas se descolam e evolam pelos céus, a pedras, pequenas ou pedregulhos, espalhadas ou juntinhas e a regatos e fontes que jorram espontaneamente.
(ler mais...)


A crise das democracias liberais - jorge carreira maia »  2024-03-08  »  Jorge Carreira Maia

A crise das democracias liberais, que tanto e a tantos atormenta, pode residir num conflito entre a natureza humana e o regime democrático-liberal. Num livro de 2008, Democratic Authority – a philosophical framework, o filósofo David.
(ler mais...)


A carne e os ossos - pedro borges ferreira »  2024-03-08  »  Pedro Ferreira

Existe um paternalismo naqueles que desenvolvem uma compreensão do mundo extensiva que muitas vezes não lhes permite ver os outros, quiçá a si próprios, como realmente são. A opinião pública tem sido marcada por reflexões sobre a falta de memória histórica como justificação do novo mundo intolerante que está para vir, adivinho eu, devido à intenção de voto que se espera no CHEGA.
(ler mais...)


O Flautista de Hamelin... »  2024-02-28  »  Hélder Dias

Este mundo e o outro - joão carlos lopes »  2024-02-22 

Escreve Jorge Carreira Maia, nesta edição, ter a certeza de que este mundo já não é o seu e que o mundo a que chamou seu acabou. “Não sei bem qual foi a hora em que as coisas mudaram, em que a megera da História me deixou para trás”, vai ele dizendo na suas palavras sempre lúcidas e brilhantes, concluindo que “vivemos já num mundo tenebroso, onde os clowns ainda não estão no poder, mas este já espera por eles, para que a História satisfaça a sua insaciável sede de sangue e miséria”.
(ler mais...)


2032: a redenção do Planeta - jorge cordeiro simões »  2024-02-22  »  Jorge Cordeiro Simões

 

 


O dia 5 de Fevereiro de 2032, em que o Francisco Falcão fez 82 anos - aos quais nunca julgara ir chegar -, nasceu ainda mais frio do que os anteriores e este Inverno parecia ser nisso ainda pior que os que o antecederam, o que contribuiu para que cada vez com mais frequência ele se fosse deixando ficar na cama até mais tarde e neste dia festivo só de lá iria sair depois do meio-dia.
(ler mais...)


Avivar a memória - antónio gomes »  2024-02-22  »  António Gomes

Há dias atrás, no âmbito da pré-campanha eleitoral, visitei o lugar onde passei a maior parte da minha vida (47 anos), as oficinas da CP no Entroncamento.

Não que tivesse saudades, mas o espaço, o cheiro e acima de tudo a oportunidade de rever alguns companheiros que ainda por lá se encontram, que ainda lá continuam a vender a sua força de trabalho, foi uma boa recompensa.
(ler mais...)

 Mais lidas - Opinião (últimos 30 dias)
»  2024-04-10  »  Jorge Carreira Maia As eleições e o triunfo do pensamento mágico - jorge carreira maia