A lixeira da vergonha - joão carlos lopes
Nos últimos trinta anos, o rio Almonda tem sido vítima da demagogia, do desprezo e da hipocrisia de uma maioria que, há décadas, enche discursos, profissões de fé de bater no peito e manifestos eleitorais com o “amor ao nosso rio Almonda”. Na hora da verdade, e já se passaram muitas horas da verdade desde 1994, o rio Almonda, mesmo em troços urbanos, continua como sempre tem estado: sujo, votado ao abandono, leito feito depósito de lixo, cada vez mais lixo.
Há duas excepções, neste panorama desolador: cerca do ano 2000 foi feita uma limpeza do leito, no troço da avenida e entre o Caldeirão e os Gafos e, note-se, foi construído junto aos Gafos o açude que permite que o rio tenha alguma água, nestes troços, nos meses de verão, coisa que, durante séculos, não acontecia. A memória é curta: parece que toda a gente se esqueceu que logo a seguir à ponte da Levada, assim que chegava o Verão o rio corria em riachitos por entre as pedras, as enormes pedras do leito à vista, na Bácora formava-se uma grande ilha com a água a correr por dois fios, no Lamego o rio era um terreiro, onde se andava a pé como em qualquer rua, com um fiozito de água que, às vezes, parava e não tinha comunicação com o troço seguinte a seguir à ponte. Aliás, era por esta razão que, antigamente, o leito era limpo quase todos os anos no Verão, com as carroças dentro dele a acarretar os lixos das invernias [por isso, as estacas em que assentam os muros ficavam meses a apanhar sol, ao contrário de agora, em que, exactamente por causa do nível da água resultante do açude, estão sempre cobertas de água]. É patética a tese de que os três muros que caíram na grande cheia de 2001, a última, foi porque as estacas tinham estado dois meses a apanhar sol dois meses enquanto se limpou o rio. De resto, os muros caíram pelo topo e não pela base, mas isso são outros quinhentos a que voltaremos.
Durante este verão, a abertura temporária da adufa do novo açude de Santo André, com a consequente descida do nível das águas nestes dias, veio pôr a descoberto o verdadeiro escândalo que é o tal desprezo a que é votado o rio, mesmo dentro da cidade. Requalificou-se um troço de margem, no Almonda Parque, uma boa obra, mas não se fez o básico, o que se exigia: a limpeza do leito. É obra para inglês ver. Na Bácora, em vinte metros, há um cemitério de cinco pneus, um deles de camião; depois são chapas de zinco, ferros, tubos, troncos, lixo de toda a ordem; mais à frente, de um lado ao outro, jaz um tubo de lata que ali está desde a década de 50, imagine-se, mas desactivado há mais de 50 anos; no Lamego, onde as sapatas da ponte funcionam como travão, o leito está assoreado de lixo, panorama infâme, porque em cada Verão não se tiram os troncos que ali ficam aprisionados e que vão funcionando como barreira para acumulação de mais lixo, sempre mais lixo. Esta abertura da adufa poderia ter sido aproveitada, houvesse um mínimo de planeamento, para proceder à limpeza do leito. Não vai acontecer. Um dia destes fecha-se o açude, as águas subirão e a lixeira da vergonha ficará outra vez soterrada, escondida, à espera de mais lixo do próximo inverno.
Durante anos, um célebre quadro de Luís Maurício era ícon de um espaço cultural da cidade de então: “Rio Almerda”, assim se chamava a pintura, em que uma serpente de lixos viscosos percorria a cidade sobre o leito do rio. Hoje, tirando o ilusionismo dos adereços de superfície e das margens requalificadas, o leito do rio Almonda continua igual. A mesma almerda, dir-se-ia.
A lixeira da vergonha - joão carlos lopes
Nos últimos trinta anos, o rio Almonda tem sido vítima da demagogia, do desprezo e da hipocrisia de uma maioria que, há décadas, enche discursos, profissões de fé de bater no peito e manifestos eleitorais com o “amor ao nosso rio Almonda”. Na hora da verdade, e já se passaram muitas horas da verdade desde 1994, o rio Almonda, mesmo em troços urbanos, continua como sempre tem estado: sujo, votado ao abandono, leito feito depósito de lixo, cada vez mais lixo.
Há duas excepções, neste panorama desolador: cerca do ano 2000 foi feita uma limpeza do leito, no troço da avenida e entre o Caldeirão e os Gafos e, note-se, foi construído junto aos Gafos o açude que permite que o rio tenha alguma água, nestes troços, nos meses de verão, coisa que, durante séculos, não acontecia. A memória é curta: parece que toda a gente se esqueceu que logo a seguir à ponte da Levada, assim que chegava o Verão o rio corria em riachitos por entre as pedras, as enormes pedras do leito à vista, na Bácora formava-se uma grande ilha com a água a correr por dois fios, no Lamego o rio era um terreiro, onde se andava a pé como em qualquer rua, com um fiozito de água que, às vezes, parava e não tinha comunicação com o troço seguinte a seguir à ponte. Aliás, era por esta razão que, antigamente, o leito era limpo quase todos os anos no Verão, com as carroças dentro dele a acarretar os lixos das invernias [por isso, as estacas em que assentam os muros ficavam meses a apanhar sol, ao contrário de agora, em que, exactamente por causa do nível da água resultante do açude, estão sempre cobertas de água]. É patética a tese de que os três muros que caíram na grande cheia de 2001, a última, foi porque as estacas tinham estado dois meses a apanhar sol dois meses enquanto se limpou o rio. De resto, os muros caíram pelo topo e não pela base, mas isso são outros quinhentos a que voltaremos.
Durante este verão, a abertura temporária da adufa do novo açude de Santo André, com a consequente descida do nível das águas nestes dias, veio pôr a descoberto o verdadeiro escândalo que é o tal desprezo a que é votado o rio, mesmo dentro da cidade. Requalificou-se um troço de margem, no Almonda Parque, uma boa obra, mas não se fez o básico, o que se exigia: a limpeza do leito. É obra para inglês ver. Na Bácora, em vinte metros, há um cemitério de cinco pneus, um deles de camião; depois são chapas de zinco, ferros, tubos, troncos, lixo de toda a ordem; mais à frente, de um lado ao outro, jaz um tubo de lata que ali está desde a década de 50, imagine-se, mas desactivado há mais de 50 anos; no Lamego, onde as sapatas da ponte funcionam como travão, o leito está assoreado de lixo, panorama infâme, porque em cada Verão não se tiram os troncos que ali ficam aprisionados e que vão funcionando como barreira para acumulação de mais lixo, sempre mais lixo. Esta abertura da adufa poderia ter sido aproveitada, houvesse um mínimo de planeamento, para proceder à limpeza do leito. Não vai acontecer. Um dia destes fecha-se o açude, as águas subirão e a lixeira da vergonha ficará outra vez soterrada, escondida, à espera de mais lixo do próximo inverno.
Durante anos, um célebre quadro de Luís Maurício era ícon de um espaço cultural da cidade de então: “Rio Almerda”, assim se chamava a pintura, em que uma serpente de lixos viscosos percorria a cidade sobre o leito do rio. Hoje, tirando o ilusionismo dos adereços de superfície e das margens requalificadas, o leito do rio Almonda continua igual. A mesma almerda, dir-se-ia.
![]() Imagino que as últimas eleições terão sido oportunidade para belos e significativos encontros. Não é difícil pensar, sem ficar fora da verdade, que, em muitas empresas, patrões e empregados terão ambos votado no Chega. |
![]() "Hire a clown, get a circus" * Ele é antissistema. Prometeu limpar o aparelho político de toda a corrupção. Não tem filtros e, como o povo gosta, “chama os bois pelo nome”, não poupando pessoas ou entidades. |
![]() A eleição de um novo Papa é um acontecimento sempre marcante, apesar de se viver, na Europa, em sociedades cada vez mais estranhas ao cristianismo. Uma das grandes preocupações, antes, durante e após a eleição de Leão XIV, era se o sucessor de Francisco seria conservador ou progressista. |
![]() |
![]() |
![]() |
![]() |
![]() |
![]() |
![]() Agora que nos estamos a aproximar, no calendário católico, da Páscoa, talvez valha a pena meditar nos versículos 36, 37 e 38, do Capítulo 18, do Evangelho de João. Depois de entregue a Pôncio Pilatos, Jesus respondeu à pergunta deste: Que fizeste? Dito de outro modo: de que és culpado? Ora, a resposta de Jesus é surpreendente: «O meu reino não é deste mundo. |