E agora? por João Carlos Lopes
Opinião » 2020-04-21 » João Carlos Lopes
Depois de loucos 20 anos e de centenas e centenas de milhões de euros de investimento em escolas, piscinas, bibliotecas, centros escolares, pavilhões, centro de congressos, hospitais e centros de saúde, estradas e centros culturais, mercados e jardins, parques e viadutos, rotundas e avenidas, temos um território em perda de densidade, temos o “interior” já aqui, a 50 km do mar em linha recta e a 50 minutos de Lisboa. Como se nada disto tivesse valido a pena.
Somos cada vez menos e mais velhos, e são cada vez menos os que querem ficar por aqui. Vão-se embora a sete pés os mais habilitados, instruídos e talentosos, deixando-nos em profunda regressão de inteligência instalada e de massa crítica.
A grande vaga de melhoria das condições de vida das vilas e pequenas e médias cidades nada estancou, antes pelo contrário: o novo êxodo é um movimento civilizacional longo, que começou há muitas décadas na fuga das aldeias para as vilas e que agora, esvaziadas as aldeias, leva massas de gente das pequenas cidades para os grandes eixos urbanos do país, três ou quatro apenas.
Há muitas décadas, foram a massificação de escolas pelas aldeias, como janelas abertas ao mundo e à liberdade, e a instrução em sentido lato, que levaram ao impulso de conhecer outras realidades para lá dos limites que duravam há séculos. Agora, quanto mais se atinge a excelência do ensino e as competências dos jovens de uma cidade, mais eles também se vão embora, porque mais preparados para percorrer outros mundos. São os melhores músicos, médicos, jornalistas ou engenheiros. Não há nada a fazer.
As políticas locais, cobertas por decisões nacionais mais amplas, de substituição das economias locais de pequenos circuitos, mas fixadoras de mão-de-obra e de redes sócio-económicas comunitárias, pelos grandes empórios da distribuição de produtos de consumo, levou à destruição completa do comércio local, dos pequenos negócios e das redes de produção agro-industrial locais. Diminuíram os postos de trabalho, precarizaram-se as relações laborais, regrediu a qualidade do emprego.
As administrações locais, erráticas e desorientadas, sem objectivos sólidos, apostam no supérfluo, na vergonhosa gestão pelo facebook, na imagem parola, no gasto de milhares e milhares de euros em acções de “promoção da terra” (pagando iniciativas de outrém, vergando-se em milhares de euros às investidas canibalescas das televisões em programas miseráveis que nada acrescentam, muitos só ridicularizam), esvaem-se em gastos de energia ridículos em concursos de maravilhas, outrora coisas infantis, atiram a tudo o que mexe numa ânsia desesperada de conservar o poder pelo poder, compram escandalosamente tudo em redor com recurso ao subsídio, porque nada mais que estar no poder, apenas e só, alimenta a total inacção prospectiva, planificadora, de médio e longo prazo.
Assim se joga o chamado poder local, entre a impossibilidade de enfrentar tendências gerais e políticas nacionais, mais determinantes na vida das pessoas (que por isso votam mais nas legislativas do que nas autárquicas), e a sua incapacidade de fazer opções tendentes a tornar excelentes as condições concretas de vida dos que cá ficam, único cartão de visita válido para se poder aspirar, a longo prazo, a esperar algum retorno dos que saíram ou que optarão um dia por mudar de vida.
Dramaticamente, este quadro já de si desesperante (traduzido nas tendências explicitadas no artigo http://www.jornaltorrejano.pt/sociedade/noticia/?n-25b2ed1f), cruza-se agora com o pesadelo que se abateu sobre o mundo e este nosso pequeno mundo. Nada podia ter sido pior. Resta-nos a esperança de que a realidade, de tão impressiva e impositiva, nos obrigue a todos, por uma vez, e sobretudo aos que estão transitoriamente no poder, a fixarmo-nos no essencial que temos para fazer e só no essencial: aquilo que eleva e consolida o bem comum, utilizando os recursos com rigor e transparência democrática. A não ser assim, o vírus permanecerá e continuará a dissolver a cidade e as nossa vidas, as vidas dos que cá estamos.
E agora? por João Carlos Lopes
Opinião » 2020-04-21 » João Carlos LopesDepois de loucos 20 anos e de centenas e centenas de milhões de euros de investimento em escolas, piscinas, bibliotecas, centros escolares, pavilhões, centro de congressos, hospitais e centros de saúde, estradas e centros culturais, mercados e jardins, parques e viadutos, rotundas e avenidas, temos um território em perda de densidade, temos o “interior” já aqui, a 50 km do mar em linha recta e a 50 minutos de Lisboa. Como se nada disto tivesse valido a pena.
Somos cada vez menos e mais velhos, e são cada vez menos os que querem ficar por aqui. Vão-se embora a sete pés os mais habilitados, instruídos e talentosos, deixando-nos em profunda regressão de inteligência instalada e de massa crítica.
A grande vaga de melhoria das condições de vida das vilas e pequenas e médias cidades nada estancou, antes pelo contrário: o novo êxodo é um movimento civilizacional longo, que começou há muitas décadas na fuga das aldeias para as vilas e que agora, esvaziadas as aldeias, leva massas de gente das pequenas cidades para os grandes eixos urbanos do país, três ou quatro apenas.
Há muitas décadas, foram a massificação de escolas pelas aldeias, como janelas abertas ao mundo e à liberdade, e a instrução em sentido lato, que levaram ao impulso de conhecer outras realidades para lá dos limites que duravam há séculos. Agora, quanto mais se atinge a excelência do ensino e as competências dos jovens de uma cidade, mais eles também se vão embora, porque mais preparados para percorrer outros mundos. São os melhores músicos, médicos, jornalistas ou engenheiros. Não há nada a fazer.
As políticas locais, cobertas por decisões nacionais mais amplas, de substituição das economias locais de pequenos circuitos, mas fixadoras de mão-de-obra e de redes sócio-económicas comunitárias, pelos grandes empórios da distribuição de produtos de consumo, levou à destruição completa do comércio local, dos pequenos negócios e das redes de produção agro-industrial locais. Diminuíram os postos de trabalho, precarizaram-se as relações laborais, regrediu a qualidade do emprego.
As administrações locais, erráticas e desorientadas, sem objectivos sólidos, apostam no supérfluo, na vergonhosa gestão pelo facebook, na imagem parola, no gasto de milhares e milhares de euros em acções de “promoção da terra” (pagando iniciativas de outrém, vergando-se em milhares de euros às investidas canibalescas das televisões em programas miseráveis que nada acrescentam, muitos só ridicularizam), esvaem-se em gastos de energia ridículos em concursos de maravilhas, outrora coisas infantis, atiram a tudo o que mexe numa ânsia desesperada de conservar o poder pelo poder, compram escandalosamente tudo em redor com recurso ao subsídio, porque nada mais que estar no poder, apenas e só, alimenta a total inacção prospectiva, planificadora, de médio e longo prazo.
Assim se joga o chamado poder local, entre a impossibilidade de enfrentar tendências gerais e políticas nacionais, mais determinantes na vida das pessoas (que por isso votam mais nas legislativas do que nas autárquicas), e a sua incapacidade de fazer opções tendentes a tornar excelentes as condições concretas de vida dos que cá ficam, único cartão de visita válido para se poder aspirar, a longo prazo, a esperar algum retorno dos que saíram ou que optarão um dia por mudar de vida.
Dramaticamente, este quadro já de si desesperante (traduzido nas tendências explicitadas no artigo http://www.jornaltorrejano.pt/sociedade/noticia/?n-25b2ed1f), cruza-se agora com o pesadelo que se abateu sobre o mundo e este nosso pequeno mundo. Nada podia ter sido pior. Resta-nos a esperança de que a realidade, de tão impressiva e impositiva, nos obrigue a todos, por uma vez, e sobretudo aos que estão transitoriamente no poder, a fixarmo-nos no essencial que temos para fazer e só no essencial: aquilo que eleva e consolida o bem comum, utilizando os recursos com rigor e transparência democrática. A não ser assim, o vírus permanecerá e continuará a dissolver a cidade e as nossa vidas, as vidas dos que cá estamos.
Família tradicional e luta do bem contra o mal - jorge carreira maia » 2024-04-24 » Jorge Carreira Maia A publicação do livro Identidade e Família – Entre a Consistência da Tradição e os Desafios da Modernidade, apresentado por Passos Coelho, gerou uma inusitada efervescência, o que foi uma vitória para os organizadores desta obra colectiva. |
Caminho de Abril - maria augusta torcato » 2024-04-22 » Maria Augusta Torcato Olho para o meu caminho e fico contente. Acho mesmo que fiz o caminho de Abril. O caminho que Abril representa. No entanto, a realidade atual e os desafios diários levam-me a desejar muito que este caminho não seja esquecido, não por querer que ele se repita, mas para não nos darmos conta, quase sem tempo de manteiga nos dentes, que estamos, outra vez, lá muito atrás e há que fazer de novo o caminho com tudo o que isso implica e que hoje seria incompreensível e inaceitável. |
As eleições e o triunfo do pensamento mágico - jorge carreira maia » 2024-04-10 » Jorge Carreira Maia Existe, em Portugal, uma franja pequena do eleitorado que quer, deliberadamente, destruir a democracia, não suporta os regimes liberais, sonha com o retorno ao autoritarismo. Ao votar Chega, fá-lo racionalmente. Contudo, a explosão do eleitorado do partido de André Ventura não se explica por esse tipo de eleitores. |
Eleições "livres"... » 2024-03-18 » Hélder Dias |
Este é o meu único mundo! - antónio mário santos » 2024-03-08 » António Mário Santos Comentava João Carlos Lopes , no último Jornal Torrejano, de 16 de Fevereiro, sob o título Este Mundo e o Outro, partindo, quer do pessimismo nostálgico do Jorge Carreira Maia (Este não é o meu mundo), quer da importância da memória, em Maria Augusta Torcato, para resistir «à névoa que provoca o esquecimento e cegueira», quer «na militância política e cívica sempre empenhada», da minha autoria, num país do salve-se quem puder e do deixa andar, sempre à espera dum messias que resolva, por qualquer gesto milagreiro, a sua raiva abafada de nunca ser outra coisa que a imagem crónica de pobreza. |
Plantação intensiva: do corte à escovinha e tudo em fila aos horizontes metalificados - maria augusta torcato » 2024-03-08 » Maria Augusta Torcato Não sei se por causa das minhas origens ou simplesmente da minha natureza, há em mim algo, muito forte, que me liga a árvores, a plantas, a flores, a animais, a espaços verdes ou amarelos e amplos ou exíguos, a serras mais ou menos elevadas, de onde as neblinas se descolam e evolam pelos céus, a pedras, pequenas ou pedregulhos, espalhadas ou juntinhas e a regatos e fontes que jorram espontaneamente. |
A crise das democracias liberais - jorge carreira maia » 2024-03-08 » Jorge Carreira Maia A crise das democracias liberais, que tanto e a tantos atormenta, pode residir num conflito entre a natureza humana e o regime democrático-liberal. Num livro de 2008, Democratic Authority – a philosophical framework, o filósofo David. |
A carne e os ossos - pedro borges ferreira » 2024-03-08 » Pedro Ferreira Existe um paternalismo naqueles que desenvolvem uma compreensão do mundo extensiva que muitas vezes não lhes permite ver os outros, quiçá a si próprios, como realmente são. A opinião pública tem sido marcada por reflexões sobre a falta de memória histórica como justificação do novo mundo intolerante que está para vir, adivinho eu, devido à intenção de voto que se espera no CHEGA. |
O Flautista de Hamelin... » 2024-02-28 » Hélder Dias |
Este mundo e o outro - joão carlos lopes » 2024-02-22 Escreve Jorge Carreira Maia, nesta edição, ter a certeza de que este mundo já não é o seu e que o mundo a que chamou seu acabou. “Não sei bem qual foi a hora em que as coisas mudaram, em que a megera da História me deixou para trás”, vai ele dizendo na suas palavras sempre lúcidas e brilhantes, concluindo que “vivemos já num mundo tenebroso, onde os clowns ainda não estão no poder, mas este já espera por eles, para que a História satisfaça a sua insaciável sede de sangue e miséria”. |